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ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 2, p. 109-126, mai./ago. 2019.
http://periodicos.utfpr.edu.br/actio
Aproximações entre resolução de problemas
e modelagem matemática com o enfoque
CTS
RESUMO
Flavia Sucheck Mateus da Rocha
fsucheck@yahoo.com.br
http://orcid.org/0000-0001-6803-8898
Centro Universitário Internacional Uninter,
Curitiba, Paraná, Brasil.
Leonir Lorenzetti
leonirlorenzetti22@gmail.com
http://orcid.org/0000-0002-0208-2965
Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Curitiba, Paraná, Brasil.
Marco Aurélio Kalinke
marcokalinke@yahoo.com.br
http://orcid.org/0000-0002-5484-1724
Universidade Tecnológica Federal do
Paraná (UTFPR), Curitiba, Paraná, Brasil.
fulano@gmail.com
orcid.org/0000-0001-8327-9147
Instituição (SIGLA), Cidade, Estado, País
Beltrano de Tal
beltrano@gmail.com
orcid.org/0000-0001-8327-9147
Instituição (SIGLA), Cidade, Estado, País
Este estudo objetiva verificar a aproximação da Educação Matemática Crítica com a
abordagem Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS). Envolve uma pesquisa qualitativa, do tipo
intervenção pedagógica, realizada em um colégio da rede privada da cidade de Curitiba,
com alunos do ano do Ensino Médio, utilizando Resolução de Problemas e Modelagem
Matemática. As aulas contemplaram atividades sobre progressão aritmética, estatística,
porcentagem e funções exponenciais, trabalhadas com abordagens de resolução de
problemas, no caso do primeiro conteúdo, e modelagem matemática, para os demais. Além
dos conteúdos matemáticos, a prática abordou temáticas relativas à presença de
adolescentes em academias, uso de celular e seu impacto no cotidiano do ser humano e
efeitos da maconha no organismo. Para a análise das aproximações entre as metodologias
utilizadas e o enfoque CTS, buscou-se na literatura as principais características de tal
enfoque, bem como etapas propostas para seu desenvolvimento. A análise realizada
mostrou que a Resolução de Problemas apresentou uma sequência de reflexões sobre as
temáticas presentes nas situações-problemas semelhante às sequências indicadas para
uma abordagem CTS. O projeto realizado na Modelagem Matemática demonstrou
constante presença de interdisciplinaridade e contextualização, sendo esses os quesitos
necessários para o ensino na perspectiva CTS. Foi possível estabelecer algumas relações
para um ensino com enfoque CTS tanto na Resolução de Problemas como na Modelagem
Matemática. Percebeu-se que a mediação do professor é o que possibilita os
direcionamentos apropriados para que os conteúdos matemáticos possam trazer
embasamento científico e tecnológico para atuação dos alunos na sociedade.
PALAVRAS-CHAVE: CTS. Modelagem Matemática. Resolução de Problemas.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 2, p. 109-126, mai./ago. 2019.
INTRODUÇÃO
Com o desenvolvimento da ciência e da tecnologia o homem alterou muitos
dos seus hábitos. A comunicação, o transporte e a alimentação são exemplos de
atividades que mudaram nas últimas décadas. As tecnologias foram dando
condições para que avanços e adaptações humanas fossem possíveis. Entretanto,
mais do que utilização de ferramentas, as tecnologias demandam ações reflexivas
que possibilitem que tais ferramentas solucionem problemas. Kenski (2011, p. 24)
conceitua tecnologia dentro dessa perspectiva, afirmando que se trata de um
“conjunto de conhecimentos e princípios científicos que se aplicam ao
planejamento, à construção e à utilização de um equipamento em um
determinado tipo de atividade”.
Além do desenvolvimento tecnológico, a ciência deixou de ser vista como
estática e perfeita, dando vez a uma ciência falível e em movimento (MORIN,
2005). Os avanços científicos contribuem para cura de doenças e melhora na
qualidade de vida, da mesma forma que podem representar situações destrutivas
para o ser humano e para o meio ambiente. Assim, fazem-se necessários novos
olhares para ciência e tecnologia para que novas decisões possam ser tomadas
diariamente pelo indivíduo, tanto na utilização científica como na tecnológica.
A escola, partícipe da sociedade, nem sempre acompanha suas mudanças e
muitas vezes ainda socializa conteúdos que não preparam os estudantes para
atuarem numa sociedade contemporânea. Schirlo e Silva (2012) acreditam que é
papel dos educadores essa formação, destacando que a escola deve preparar um
cidadão crítico e com capacidade de tomada de decisões científicas e tecnológicas.
Discutir questões relacionadas a Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS)
dentro do âmbito escolar torna-se, nesta perspectiva, uma necessidade que vem
sendo explorada em disciplinas ligadas às Ciências da Natureza. A Educação
Matemática, por sua vez, embora nem sempre faça uso dessa termologia, também
vem demonstrando preocupação com o papel que o aluno exerce na
aprendizagem e com as relações que ele pode fazer entre o conteúdo a ser
desenvolvido em sala de aula e sua atuação na sociedade.
Entre as práticas em Educação Matemática, a Resolução de Problemas e a
Modelagem Matemática apresentam características convergentes com a
abordagem CTS. Pretendemos, nesse artigo, mostrar tais características,
discorrendo sobre possíveis relações entre abordagem CTS, Resolução de
Problemas e Modelagem Matemática. Para tanto, apresentaremos os resultados
de uma pesquisa realizada com utilização de Resolução de Problemas e
Modelagem Matemática em sala de aula, em turmas de ano do Ensino Médio,
com o objetivo de verificar possibilidades de conexão entre o ensino da
Matemática e a abordagem CTS.
ABORDAGEM CTS
A escola, como parte de um mundo influenciado pela ciência e tecnologia,
precisa integrar estes aspectos à sala de aula,que neles existem conhecimentos
que devem ser incorporados pelos alunos. As discussões acerca dessa
incorporação acontecem mais de cinquenta anos. Strieder (2012) alerta que
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apesar de elas acontecerem e de se observar a presença desse tipo de abordagem
em diferentes níveis de ensino, pouca atenção foi dada a ela pelos pesquisadores
da área do Ensino de Ciências até muito recentemente.
Os avanços científicos trouxeram à sociedade uma visão de que a ciência é
incontestável. Moretto (2011) menciona que a autoridade da ciência é aceita por
todos, citando como exemplo a expressão “comprovado cientificamente” que
impulsiona cidadãos a se convencerem de uma determinada verdade. Santos e
Mortimer (2002, p. 1) afirmam que “as sociedades modernas passaram a confiar
na ciência e na tecnologia como se confia em uma divindade”. Em perspectiva
contrária, os autores apresentam a ciência como incerta e provisória, que admite
novos experimentos e contestações.
Assumindo que a ciência está em movimento e pode ser continuamente
explorada e testada, a sociedade necessita de cidadãos com capacidade crítica e
argumentativa. Assim, a escola pode influenciar fortemente na minimização da
crença em uma ciência perfeita, que ela trabalha diretamente com o
conhecimento científico:
Sabe-se que o acesso ao conhecimento científico se dá de diversas formas, e
em diferentes ambientes, mas é na escola que a formação de conceitos
científicos é introduzida explicitamente, oportunizando ao ser humano a
compreensão da realidade e a superação de problemas que lhe são postos
diariamente (LORENZETTI, 2000, p. 14).
Uma abordagem de ensino com enfoque CTS possibilita que o aluno
desenvolva novos olhares para a ciência e para a tecnologia. Na abordagem CTS a
formação do cidadão é a meta. Esse cidadão pode ser um replicador do que
temos na sociedade ou um indivíduo que pode intervir no mundo a partir de seu
conhecimento científico e tecnológico. Santos e Mortimer (2002) indicam que o
objetivo desse tipo de abordagem deve ser a alfabetização científica e tecnológica
para a tomada de decisões e atuação na sociedade. Desse modo, as ações e
decisões são conduzidas pelos conhecimentos científicos e tecnológicos, ao
mesmo tempo em que a sociedade constrói e reconstrói conhecimentos. Ainda de
acordo com Santos e Mortimer (2002), a tomada de decisões deve ter por base
valores que vão além de pensamentos meramente comerciais ou econômicos.
Será por meio da discussão desses valores que contribuiremos na formação
de cidadãos críticos comprometidos com a sociedade. As pessoas, por
exemplo, lidam diariamente com dezenas de produtos químicos e têm que
decidir qual devem consumir e como fazê-lo. Essa decisão poderia ser tomada
levando-se em conta não a eficiência dos produtos para os fins que se
desejam, mas também os seus efeitos sobre a saúde, os seus efeitos
ambientais, o seu valor econômico, as questões éticas relacionadas a sua
produção e comercialização. Por exemplo, poderia ser considerado pelo
cidadão, na hora de consumir determinado produto, se, na sua produção, é
usada mão-de-obra infantil ou se os trabalhadores são explorados de maneira
desumana; se, em alguma fase, da produção ao descarte, o produto agride o
ambiente; se ele é objeto de contrabando ou de outra contravenção, etc.
(SANTOS; MORTIMER, 2002, p. 4).
Os exemplos apresentados por Santos e Mortimer (2002) representam
atitudes relacionadas ao exercício da cidadania, uma vez que, mais do que direitos,
o agir em sociedade exige deveres por parte do cidadão. Assim, implementar o
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enfoque CTS no contexto educacional possibilita que os estudantes sejam melhor
preparados para a prática da cidadania.
Para tal implantação, Santos e Mortimer (2002) apresentam um roteiro de
estratégias a serem desenvolvidas no sentido de que o objetivo da abordagem CTS
seja atingido:
a) Introdução de um problema social;
b) Análise da tecnologia relacionada ao tema social;
c) Estudo do conteúdo científico definido em função do tema social e da
tecnologia introduzida;
d) Estudo da tecnologia correlata em função do conteúdo apresentado;
e) Discussão da questão social original.
Percebemos que a contextualização tem fator predominante nos passos
citados pelos autores. Strieder (2012) também apresenta a contextualização como
necessária para uma abordagem CTS e cita a interdisciplinaridade como elemento
comum a esse enfoque. Desse modo, de acordo com Strieder (2012),
contextualização e interdisciplinaridade são duas condições para se desenvolver o
ensino com abordagem CTS. Esse tipo de abordagem requer mudanças por parte
do professor, pois seu papel e função em sala de aula se alteram. O aluno também
deixa de ser receptor de informações e passa a atuar ativamente na construção do
conhecimento.
Essas mudanças também vêm sendo discutidas por pesquisadores em
Educação Matemática que, segundo Silva (2012, p. 51), preocupam-se em
possibilitar “o desenvolvimento de conhecimentos e práticas pedagógicas que
contribui para a formação de um indivíduo crítico e atuante na sociedade”.
Para que essa formação aconteça nas aulas de Matemática, a abordagem
CTS é apresentada por Silva (2012) como uma estratégia para dar mais
aplicabilidade aos conteúdos vistos em sala de aula. Segundo essa pesquisadora, o
que prevalece nas metodologias de ensino dessa disciplina são as repetições e
memorizações que não implicam em produção do exercício de cidadania. Desse
modo, existe a necessidade de novas metodologias que levem o aluno a
“compreender a ciência como atividade que é fruto de um processo de construção
humana e do desenvolvimento de uma consciência crítica” (SILVA, 2012, p. 75).
Em convergência com Silva (2012), Almeida e Pimenta (2014, p. 153)
afirmam que:
O professor que trabalhar com o enfoque educacional CTS objetiva colocar o
ensino da matemática numa perspectiva diferenciada, contemplando os
fenômenos da vida cotidiana, trazendo para a sua sala de aula os aspectos
sociais e históricos correspondentes aos problemas vivenciados pela
humanidade.
Os fenômenos cotidianos podem ser trazidos para a aula de Matemática
quando se escolhem situações problemas contextualizadas. Para Silva (2012), a
contextualização de problemas matemáticos pode levar os alunos a reflexões
sobre a disciplina, o que potencializa seu papel na construção social.
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Como proposta desse tipo de trabalho, com predomínio de
contextualização, Pinheiro (2005) apresenta resultados de uma pesquisa
relacionada à inserção da abordagem CTS no ensino de Matemática em nível de
Ensino Médio. Ela utiliza a Matemática “como forma de promover nos educandos
a formação de atitudes crítico-reflexivas em termos da relação da matemática com
o contexto científico-tecnológico e social” (PINHEIRO, 2005, p. 5). A pesquisadora
notou o envolvimento dos alunos com o processo de aprendizagem quando
utilizou vídeos, textos e debates que envolviam conteúdos matemáticos e temas
sociais, contextualizados.
Nesse envolvimento, possibilita-se ao aluno compreender os efeitos da
matemática na sociedade e a influência da sociedade no desenvolvimento de
novos aportes matemáticos; os efeitos da tecnologia na sociedade e a sua
dependência do conhecimento matemático; o impacto da ciência matemática
no desenvolvimento tecnológico e o impacto da tecnologia em novas
descobertas matemáticas. Isso implica que o processo ensino-aprendizagem
exige que se assuma uma postura diferente por parte dos seus envolvidos,
pois, para se evidenciar as inter-relações entre esses aspectos, devem ser
considerados os fatores sociais, econômicos e históricos com os quais o
conhecimento em questão está vinculado (PINHEIRO, 2005, p. 225).
Essa postura diferente de professores e alunos no ensino e na aprendizagem
da Matemática é o que propõem algumas Tendências em Educação Matemática,
como a Modelagem Matemática e a Resolução de Problemas.
Tais tendências são apresentadas por Almeida e Pimenta (2014) como as
possibilidades com maior proximidade com a abordagem CTS. Lui e Machado
(2009) destacam a possibilidade de utilizar a Modelagem Matemática para
enfoque CTS, desde que haja um comprometimento com os valores éticos e morais
no uso de tal proposta. Da mesma forma, Schirlo e Silva (2012, p. 145) afirmam
que dentro de uma perspectiva CTS o aluno deverá desenvolver a capacidade de
resolver problemas e construir modelos matemáticos, a partir de questionamentos
apropriados que forneçam “subsídios para a construção do saber e do ensinar a
aprender para, assim, formar cidadãos responsáveis e socialmente conscientes”.
TENDÊNCIAS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
Durante muitos anos a Matemática vem sendo vista como uma disciplina
complexa, que em muitos casos tem pouca relação com o cotidiano do aluno.
Muitos estudantes, ao se depararem com situações práticas que demandam de um
determinado conhecimento matemático para tomada de decisões, não
conseguem relacionar e utilizar os conteúdos aprendidos na escola, o que pode
representar prejuízos na sua atuação como cidadão.
Embora alguns materiais didáticos da disciplina tragam problemas
supostamente relacionados à vida do estudante, percebe-se que as
exemplificações apresentadas raramente estão, de fato, contextualizadas.
Algumas pesquisas têm demonstrado que, embora os livros didáticos atuais
tragam mais possibilidades de contextualização, ainda ocorre preponderância de
exercícios de matemática pura, sem relação com a vida cotidiana. Barros e Lima
(2015), por exemplo, ao analisarem materiais voltados para a educação do campo,
perceberam que a maioria dos exercícios não contemplavam situações cotidianas
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dos estudantes. Abreu e Carrião (2015), investigando livros didáticos para o Ensino
Médio, também perceberam que a maior parte das atividades estão concentradas
em um contexto puramente matemático. No mesmo viés, Souza e Bittar (2013, p.
11-12), ao realizarem uma pesquisa sobre livros didáticos de matemática, pontuam
que “situações que aparentemente são contextualizadas, apresentam contextos
extremamente artificiais”. As autoras fazem uma crítica a esse tipo de
contextualização, que sugere apenas uma ilustração, ao invés de contribuir para
uma formação do estudante para o exercício da cidadania.
Alguns exercícios elaborados pelos professores em sala de aula também
indicam um afastamento entre a Matemática da escola e o dia a dia da sociedade.
Na figura 1 há um exemplo de um problema matemático que, embora possa estar
contextualizado em algum tipo de ambiente, raramente se refere ao cotidiano de
muitos alunos.
Figura 1 Exemplo de problema de Matemática
Fonte: autoria própria (2017).
Esse tipo de situação é criticado por Skovsmose (2007) quando este autor se
refere a um ensino tradicional da Matemática que segue um roteiro de explicação
e resolução de exercícios preestabelecidos, muitas vezes pouco realistas. O autor
considera que os exemplos utilizados em aulas tradicionais de Matemática se
referem à uma realidade virtual, criada, que não representa o cotidiano do aluno.
A sua proposta é que, ao contrário, seja praticada uma Educação Matemática
Crítica.
Na mesma vertente, Lins (2012, p. 103) menciona que “há um considerável
estranhamento entre a Matemática acadêmica (oficial, da escola, formal, do
matemático) e a Matemática da rua”, sendo necessária uma aproximação da
realidade do aluno, sua atuação na sociedade e o que ele aprende na aula de
Matemática.
De acordo com Almeida e Pimenta (2014, p. 152) um ensino de qualidade
deve “oportunizar uma efetiva construção do conhecimento pelos indivíduos
envolvidos no processo e não apenas uma acumulação de informações repassadas
no ambiente escolar”. Para os autores este ensino deve possibilitar a construção
do conhecimento pelo aluno, a alfabetização científica contínua e o
desenvolvimento do pensamento. No mesmo viés:
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Um ensino de Matemática que valorize a Educação Matemática Crítica deve
fornecer aos estudantes instrumentos que os auxiliem, tanto na análise de
uma situação crítica quanto na busca por alternativas para resolver a
situação. Nesse sentido, deve-se não somente ensinar aos alunos a usar
modelos matemáticos, mas antes levá-los a questionar o porquê, como, para
quê e quando utilizá-los (PAIVA; SÁ, 2011, p. 1).
Como resposta à necessidade de mudanças no ensino de Matemática surgiu,
na década de 1980, um grupo de possibilidades que ficou conhecido como
Tendências em Educação Matemática. Almeida e Pimenta (2014) advertem que
mesmo sendo pesquisadas mais de duas décadas, elas ainda são pouco
utilizadas. Os autores citam a predominância de uma educação bancária, na qual
os conteúdos são apenas depositados em sala de aula e defendem a necessidade
de uma nova postura por parte de professores, que permita que “o aluno tenha
condições de aprender mais e melhor e que esse aprendizado tenha reflexões em
suas opções diárias de consumo” (ALMEIDA; PIMENTA, 2014, p. 154).
Lopes e Borba (1994) já mencionavam a necessidade de uma nova postura,
citando que a escola precisa preparar o aluno para atuação em sociedade, levando-
o à reflexão e ação. Os autores citam a Educação Matemática Crítica de Skovsmose
como uma opção para que a Matemática impulsione transformações sociais.
Uma forma de aproximação da Matemática com o cotidiano se dá pelo uso
da Modelagem Matemática. De acordo com Lopes e Borba (1994, p. 55) a
Modelagem Matemática “é uma tentativa de traduzir um problema surgido no
mundo real para a linguagem matemática, como forma de resolvê-lo com maior
precisão possível”.
A modelagem consiste, essencialmente, na arte de transformar situações da
realidade em problemas matemáticos cujas soluções devem ser interpretadas
na linguagem usual, além disso, possibilita ao professor trabalhar com
projetos cujo tema veio de uma situação, de um problema real, busca
entender refletir sobre uma porção dessa realidade, tenta explicar, ou mesmo
agir sobre ela, usando informações ou dados que provêm da própria realidade
dos alunos (ALMEIDA; PIMENTA, 2014, p. 158).
A Modelagem Matemática tem como característica principal a utilização de
uma situação inicial “não matemática” para exploração em sala de aula. Para que
essa situação possa ser escolhida, é necessário que o professor leve em
consideração o contexto dos alunos. A partir da escolha do tema a situação é
transformada em linguagem matemática e os resultados encontrados servem de
norte para que os alunos reflitam sobre o tema estudado. Lui e Machado (2009)
apontam a interdisciplinaridade como característica intrínseca a esses processos.
Além de possibilitar interdisciplinaridade nas aulas de Matemática, a
Modelagem pode ser utilizada durantes aulas de outras disciplinas. Na Física, por
exemplo, ela é utilizada para que situações da natureza possam ser representadas
por meio de fórmulas ou gráficos. Moutinho (2007), em uma pesquisa que buscou
unir a abordagem CTS e a Modelagem Matemática como metodologia para o
ensino de Física, aponta que a utilização da Modelagem proporciona a descrição,
a análise e a interpretação dos fenômenos naturais, repercutindo em novas
reflexões sobre a aprendizagem.
Ainda como alternativa de metodologia inovadora para o ensino da
Matemática, a Resolução de Problemas é uma possibilidade bastante difundida,
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pesquisada e documentada. A partir de uma situação-problema proposta pelo
professor, o aluno procura formas de solucioná-la e apresentar seus argumentos e
procedimentos. Almeida e Pimenta (2014) afirmam que a partir da Resolução de
Problemas várias habilidades podem ser desenvolvidas.
A resolução de problema permite verificar a solução encontrada, conferir o
resultado através de outros caminhos, efetuar uma revisão crítica do trabalho
realizado com o intuito de conferir o resultado e o raciocínio utilizado, isto é,
examinar se a solução obtida está correta, se existe outra maneira de resolver
o problema e se é possível utilizar este método para solucionar outros
problemas (ALMEIDA; PIMENTA, 2014, p. 156).
Na Resolução de Problemas o professor tem papel mediador, apresentando
a situação-problema, incentivando o aluno a encontrar soluções e auxiliando-o a
estruturar as ideias surgidas. Assim, o professor precisa ter condições de
desempenhar esse papel. Onuchic e Allevato (2012) afirmam que o professor de
Matemática não está sendo bem preparado para desempenhar suas funções, o
que acarreta em mau uso da Resolução de Problemas. Como é papel do aluno
encontrar soluções para a situação-problema, muitos professores apenas esperam
as respostas e as corrigem, sem instigar a criatividade e criticidade de seus alunos.
Apesar da Resolução de Problemas representar uma opção interessante
para preparar o aluno a utilizar Matemática em sua ação enquanto cidadão, alguns
obstáculos ainda precisam ser superados. O que predomina nos livros de
Matemática são problemas desconexos com a realidade, como o apresentado na
figura 1 e evidenciado nas pesquisas de Barros e Lima (2015), Abreu e Carrião
(2015) e Souza e Bittar (2013).
Assim, o professor precisa estar apto a escolher situações que, de fato,
representem desafios para os alunos, por estarem relacionadas aos seus
contextos. Além disso, a Resolução de Problemas deve auxiliar na construção do
conhecimento matemático. Para Onuchic e Allevato (2012, p. 240), por meio dessa
prática “deve-se fazer conexões entre os diferentes ramos da Matemática,
gerando novos conceitos e novos conteúdos”. Essas conexões precisam ser
estabelecidas com o apoio do professor, que é determinante para que essa
abordagem seja favorável ao ensino de Matemática.
METODOLOGIA
Com o intuito de verificar possibilidades de conexão entre o ensino da
Matemática e a abordagem CTS realizamos uma pesquisa qualitativa, aplicada em
aulas de Matemática, a fim de observar o processo de desenvolvimento de
atividades que englobem CTS, Resolução de Problemas e Modelagem Matemática.
De acordo com Godoy (1995, p. 63), “os pesquisadores qualitativos estão
preocupados com o processo e não simplesmente com os resultados do produto”.
Além disso, o estudo se caracteriza como uma pesquisa de intervenção
pedagógica, que, segundo Damiani (2012), apresenta as seguintes características:
1) são pesquisas aplicadas, em contraposição a pesquisas fundamentais; 2)
partem de uma intenção de mudança ou inovação, constituindo-se, então,
em práticas a serem analisadas; 3) trabalham com dados criados, em
contraposição a dados já existentes, que são simplesmente coletados; 4)
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envolvem uma avaliação rigorosa e sistemática dos efeitos de tais práticas,
isto é, uma avaliação apoiada em métodos científicos, em contraposição às
simples descrições dos efeitos de práticas que visam a mudança ou inovação
(DAMIANI, 2012, p. 7).
Para Damiani et al. (2013, p. 58) as pesquisas de intervenção pedagógica o
investigações que envolvem o planejamento e a implementação de
interferências, destinadas a produzir avanços ou melhorias nos processos de
aprendizagem dos sujeitos que delas participam e a posterior avaliação dos efeitos
dessas interferências”.
Iniciamos este trabalho buscando na literatura pesquisas que tratam da
aproximação entre a abordagem CTS e as práticas em Educação Matemática
(SHIRLO; SILVA, 2012; ALMEIDA; PIMENTA, 2014; LUI; MACHADO, 2009). A partir
das convergências encontradas nesses estudos, selecionamos as metodologias de
Resolução de Problemas e Modelagem Matemática, que possuem características
próximas às da abordagem CTS, de acordo com os apontamentos dos autores
analisados.
À época da pesquisa, a primeira autora deste trabalho atuava como
professora do Ensino Médio, em uma escola da rede privada da cidade de Curitiba.
Assim, optamos por aplicar as atividades nas turmas deano dessa escola. Como
realizamos atividades em grupos, a disposição das salas dessas turmas favoreceu
a escolha e as atividades foram desenvolvidas com três turmas compostas de 35
alunos cada.
A pesquisa foi realizada em duas etapas: a primeira utilizando Resolução de
Problemas, com o conteúdo de Progressão Aritmética e a segunda com apoio de
práticas de Modelagem Matemática. Os conteúdos faziam parte do planejamento
anual da escola, disponibilizados no material didático utilizado.
As aulas que contemplaram a resolução de problemas trouxeram situações-
problemas previamente elaboradas para serem resolvidas pelos estudantes, em
equipes. O conteúdo não foi explicado anteriormente pela professora, sendo
necessário um processo investigativo e participativo em cada equipe para chegar
aos resultados. Após a resolução, cada equipe deveria apresentá-la para a turma,
explicando as etapas do processo desenvolvido.
A modelagem matemática foi praticada por meio de um projeto
interdisciplinar. Optamos por não selecionar um determinado conteúdo, mas, a
partir de um tema “não matemático”, possibilitar estudos sobre aspectos e
conteúdos relacionados à Matemática. Desse modo, os próprios estudantes
traziam para as aulas as necessidades matemáticas que eles encontravam.
Para analisar as aproximações entre as atividades desenvolvidas e o enfoque
CTS, utilizamos o roteiro proposto por Santos e Mortimer (2002) as características
descritas na literatura consultada e os registros das aulas feitos pela professora das
turmas por meio de anotações, observação e filmagens.
ANÁLISE DOS DADOS
Na abordagem de Resolução de Problemas elaboramos situações-
problemas que visaram aproximar os assuntos abordados nas aulas ao cotidiano
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do aluno. Elas foram desenvolvidas com base no relacionamento da professora
com a turma, seus diálogos, observação de seus comportamentos em redes sociais
e debates previamente realizados.
Para o aprendizado do conteúdo de Progressão Aritmética, algumas
situações foram apresentadas às turmas durante as aulas. Os alunos foram
divididos em grupos de 5 ou 6 indivíduos e fizeram cálculos mentais ou escritos
para resolver os problemas apresentados. Nenhuma explicação sobre o conteúdo
foi dada nos momentos anteriores à resolução dos problemas e os alunos foram
convidados a resolver duas situações fictícias:
SITUAÇÃO 1: Ana participa de um grupo no WhatsApp “Melhor Turma” e
recebe muitas mensagens a cada hora. Um dia Ana acordou às 6 horas e viu que
tinha 163 mensagens não lidas, do grupo. Ana estava irritada, iria ter simulado no
colégio e não leu as mensagens. A cada hora, havia 124 mensagens a mais no
grupo. Ana mexeu no seu celular novamente quando acabou o simulado, às 11h.
Quantas mensagens havia no grupo nesse horário?
SITUAÇÃO 2: Um garoto chamado Kemmer começou um treinamento para
braços numa academia no bairro Portão. Kemmer iniciou com pesos de 1 kg na
Rosca Alternada, mas percebeu que não faziam muito efeito e que o exercício
ficava muito fácil. O instrutor orientou que ele deveria aumentar o peso somente
na próxima semana. Disse ainda que ele deveria subir 2 kg a cada semana. O
primeiro dia de Kemmer na academia corresponde a Semana 1. Qual será o peso
usado pelo Kemmer na Rosca Alternada na Semana 6?
Não foi estipulado um tempo limite para cada equipe. Entretanto, à medida
que uma delas terminava, algumas discussões eram propostas pela professora
enquanto os alunos aguardavam que seus colegas concluíssem as atividades. Entre
estes questionamentos estavam: é saudável um adolescente praticar musculação?
Até que ponto estamos viciados nas redes sociais? O celular atrapalha ou favorece
nossa vida?
Quando todos os alunos terminaram, cada equipe apresentou os resultados
encontrados e o caminho utilizado para resolução dos problemas. Em seguida a
professora comparou os caminhos apresentados, buscando aproximações nas
formas de resolução, apresentando as fórmulas de Progressão Aritmética e
realizando a formalização do conteúdo.
Como proposta de tarefa, a professora pediu para que cada equipe
aprofundasse os conhecimentos acerca dos temas presentes nas situações-
problema: mensagens de WhatsApp e adolescentes em academias. Na aula
seguinte, após a resolução de exercícios sobre o conteúdo Progressão Aritmética,
as equipes voltaram a se reunir para discutir sobre os temas, com a mediação da
professora.
As atividades propostas na abordagem de Resolução de Problemas foram
realizadas por todas as equipes, que acertaram as respostas. Houve, contudo,
formas diferenciadas de chegar aos resultados. Após cada equipe apresentar seus
resultados e métodos, a professora esquematizou as respostas e apresentou uma
fórmula que permitia o cálculo dos termos de uma progressão aritmética. Nesse
momento, os alunos identificaram que, mesmo sem conhecer a fórmula, a
utilizaram em suas resoluções.
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Na aula seguinte, quando outros exercícios foram propostos, os alunos
continuaram discutindo e comentando os passos que haviam desenvolvido na
situação anterior. Percebeu-se que eles não haviam decorado a fórmula, nem
gravado os dados quantitativos dos primeiros problemas, mas os assuntos
presentes nos exercícios (uso do celular e jovens na academia) manifestavam-se
constantemente nas suas falas. Em meio aos diálogos, os exercícios foram
realizados com facilidade pelos estudantes.
Durante as discussões sobre o uso de celular e a presença dos adolescentes
em academias, alguns conflitos surgiram e precisaram ser gerenciados pela
professora. Determinados alunos tinham opiniões contrárias quanto aos
benefícios ou malefícios dos adolescentes frequentarem academias, por exemplo,
e receberam a sugestão de levar o tema para a professora de Biologia, procurando
respaldo teórico. Essa sugestão levou em conta as ideias apresentadas por Santos
e Mortimer (2002) acerca da importância do embasamento científico para tomada
de decisões. Para que o aluno possa se posicionar a favor ou contra um
determinado assunto precisa identificar os efeitos (neste caso, os efeitos
biológicos) que tais atividades podem acarretar.
Houve uma boa aceitação por parte dos alunos em discutir temas
relacionados com seus cotidianos. O fato da falta de consenso de opiniões não
provocou que eles deixassem de participar ou demonstrassem descontentamento
com a discussão. A participação na resolução de outros exercícios foi intensa e a
curiosidade de compreender melhor os aspectos biológicos relacionados ao tema
de jovens em academia demonstrou que a atividade os levou a reflexões. Isso
evidencia que a contextualização favorece o envolvimento discente, conforme
destacado por Pinheiro (2005).
Mesmo que não sejam todos os problemas nos quais a Resolução de
Problemas permita a interdisciplinaridade, se bem explorada pelo professor ela
pode levar a uma abordagem CTS. Se compararmos os passos apresentados por
Santos e Mortimer (2002) com os passos da Resolução de Problemas, podemos
verificar que uma escolha apropriada por parte do professor acerca do tema da
situação-problema torna possível o estabelecimento de convergências entre a
Resolução de Problemas e o ensino com enfoque CTS. Apresentamos, no Quadro
1, essas possíveis convergências:
Quadro 1 - Convergências entre Resolução de Problemas e Abordagem CTS.
Resolução de Problemas
Abordagem CTS
Apresentação da situação-problema.
Apresentação do tema social
Análise e resolução da situação problema
por meio de conhecimentos matemáticos.
Análise da tecnologia relacionada e
estudo do conteúdo científico.
Formalização/ esquematização do
conhecimento.
Estudo da tecnologia em função do
conteúdo.
Discussão sobre o tema da situação-
problema.
Discussão sobre o tema social inicial.
Fonte: autoria própria (2017).
Fica evidente que, se o professor tiver uma intencionalidade, pode
aprofundar os aspectos sociais, científicos e tecnológicos relacionados ao tema em
questão, realizando as conexões citadas por Onuchic e Allevato (2012).
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 2, p. 109-126, mai./ago. 2019.
A atividade desenvolvida com Modelagem Matemática foi um projeto
realizado juntamente com professores de outras áreas de conhecimento. O tema
proposto foi “Os efeitos da maconha no organismo”. As disciplinas envolvidas
foram Biologia, Química, Filosofia, Sociologia e Matemática, cada uma explorando
conceitos próprios da sua área. O tema foi escolhido pela equipe multidisciplinar
após a observação de várias discussões relativas a ele, realizadas pelos alunos nas
redes sociais.
Para execução do projeto foi marcado um debate a ser realizado entre os
estudantes sobre a legalização da maconha. Foram separados dois grupos que se
posicionariam a favor ou contra a legalização e que, para defender suas ideias,
deveriam se apoiar em conhecimentos científicos e tecnológicos.
Este apoio foi desenvolvido pelos alunos à medida que eles apresentaram
suas dúvidas durante as aulas e os conteúdos foram sendo explorados de forma a
saná-las. Especificamente na disciplina de Matemática foram disponibilizadas
quatro aulas para que os alunos construíssem conhecimentos pertinentes às
argumentações que poderiam usar no debate.
Uma das abordagens possíveis para a Modelagem Matemática sugere que
os conteúdos sejam explorados a partir de um tema não matemático. Assim, foram
os alunos que trouxeram para as aulas de Matemática as dúvidas que possuíam
com relação ao uso da maconha, que poderiam ser respondidas com o auxílio de
ferramentas matemáticas.
Nesta perspectiva, eles desejavam saber se havia possibilidade de se calcular
o tempo que a droga permanece no organismo após a sua ingestão. A única
informação que eles possuíam era sobre a meia vida da substância, pois haviam
estudado esse conteúdo na aula de Química. Com base nela, elaboraram uma
tabela com a quantidade em função do tempo. Um dos alunos sugeriu que
fizessem o esboço de um gráfico e, ao observarem o gráfico, identificaram que se
tratava de uma função exponencial. A partir dessas ações a professora interviu,
instigando que discutissem sobre a relação entre a base da função exponencial e o
gráfico obtido, além de identificarem a sua lei de formação.
Os alunos apresentaram, nas aulas seguintes, dúvidas sobre como
representar dados das pesquisas que fizeram sobre o uso da maconha entre
adolescentes. Foi possível abordar, então, conceitos de porcentagem e estatística.
As equipes trabalharam de formas bastante autônomas, enquanto a professora
incentivava que novos conceitos estatísticos fossem introduzidos. Uma das
equipes notou que a média das idades dos usuários não representa um valor
condizente com a pesquisa que haviam realizado. A professora sugeriu que eles
utilizassem medidas de dispersão, tais como desvio, desvio padrão e variância,
identificando novos modelos matemáticos para representar a situação o
matemática que eles propunham.
A última aula dedicada ao projeto possibilitou que os alunos estruturassem
os dados pesquisados em tabelas e gráficos. Não houve grandes intervenções por
parte da professora, pois os alunos também haviam obtido dados e trabalhado
com eles nas demais disciplinas envolvidas, e estavam motivados a concluírem os
estudos.
Da mesma forma que na Resolução de Problemas, os alunos apresentaram
boa receptividade nas atividades de Modelagem Matemática. Identificamos real
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interesse em produzirem modelos matemáticos que possibilitassem respaldos
para o debate. Relacionamos esse interesse nas reflexões matemáticas à
contextualização possibilitada pelo tema do projeto. Essa relação vai ao encontro
dos apontamentos de Silva (2012) ao tratar da importância da contextualização em
Matemática.
Esse modelo de projeto tira o professor de sua zona de conforto, seja porque
os conteúdos surgem no decorrer do desenvolvimento, seja porque muitas das
dúvidas dos alunos o fazem parte da rotina comum de sala de aula. Porém, nesse
tipo de atividade o aluno também é responsável pela sua aprendizagem. Nesta
proposta de trabalho uma dúvida pode ser solucionada em conjunto, com
professores de outras disciplinas, inclusive. Percebemos que a Modelagem
Matemática provocou mudanças na postura dos envolvidos, o que convergiu com
as observações de Pinheiro (2005) acerca do Ensino de Matemática com
implementação de enfoque CTS.
A intencionalidade do professor é um aspecto importante, pois é ele quem
incentiva que o estudante procure novos modelos matemáticos para uma
determinada situação. A sua presença norteia o conhecimento que pode ser
explorado de acordo com o tema. Da mesma forma, o professor pode anular o
aprofundamento de um determinado conteúdo, caso não instigue os alunos com
perguntas apropriadas. Nesse sentido, percebemos que o grupo que utilizou novas
ferramentas estatísticas, foi aquele no qual a professora interviu mais no momento
dos cálculos, realizando questionamentos e dando sugestões. Os demais grupos
utilizaram os modelos já conhecidos por eles. Comprovamos, assim, a importância
dos questionamentos sugeridos por Schirlo e Silva (2012) no âmbito da construção
do conhecimento.
Destacamos ainda que a interdisciplinaridade teve fundamental importância
para que as atividades nas aulas de Matemática pudessem ser desenvolvidas.
Como citado por Lui e Machado (2009), essa característica é inerente aos
processos de Modelagem Matemática.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quando pensamos em aprendizagem com enfoque CTS, mais do que
aquisição de conhecimentos, os objetivos do ensino permeiam as reflexões acerca
de fatores sociais relevantes e de embasamentos científicos e tecnológicos que
possibilitem ações frente a esses fatores. Assim, a Matemática tem entre seus
papeis possibilitar que os estudantes a utilizem para tomar decisões sobre as suas
ações na sociedade. Percebemos que entre as possíveis formas de se ensinar
Matemática nesta perspectiva a Resolução de Problemas e a Modelagem
Matemática são opções viáveis.
Grande parte dos conteúdos matemáticos podem ser apresentados por
meio da Resolução de Problemas e muitos professores o fazem quase que
mecanicamente, sem refletir sobre como essa metodologia pode impactar a
construção do conhecimento científico e tecnológico pelo aluno. Acreditamos que
o sucesso dessa prática requer váriasões por parte dos professores e a primeira
delas é a escolha de situações-problema que possam vir a contribuir com o
aprendizado, bem como com a ação dos alunos como cidadãos. A intervenção do
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professor durante a Resolução dos Problemas é, de igual forma, fundamental para
que determinado conteúdo possa ser aprendido. Além disso, essa intervenção
possibilita que o aluno faça relações entre o conteúdo e sua vivência social.
Com relação à Modelagem Matemática, percebemos claramente
possibilidades de convergências com a abordagem CTS, uma vez que ela tem
possibilidade de partir de um tema social de interesse individual ou coletivo. De
acordo com Almeida e Pimenta (2014), a Modelagem Matemática pode levar o
aluno a perceber o contexto sociocultural no qual está inserido, permitindo
criticidade e capacidade de superação.
Além da contextualização, a interdisciplinaridade também está bastante
presente nessa abordagem. Sabemos que muitos fatores impedem que
professores consigam trabalhar de forma interdisciplinar, como a falta de tempo e
condições para preparar projetos ou mesmo participar de reuniões para definição
de estratégias. Contudo, sabendo das responsabilidades que temos enquanto
educadores, precisamos buscar estratégias que permitam que a contextualização
e a interdisciplinaridade estejam presentes nas aulas.
As escolhas a serem feitas em todos os âmbitos da sociedade pelos cidadãos
são fortemente influenciadas pelos conhecimentos científicos e tecnológicos que
eles possuem. Assim, não podemos nos omitir como educadores. Buscar
estratégias que permitam que os alunos estejam mais aptos a agir como cidadãos
é tarefa de todo professor, inclusive o de Matemática. Os exemplos de projetos
relatados nesta pesquisa dão indícios que a Resolução de Problemas e a
Modelagem Matemática podem ser possibilidades viáveis de serem
implementadas em uma Educação Matemática Crítica e que privilegie o enfoque
CTS.
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Approximations between troubleshooting
and mathematical modeling with the STS
approach
ABSTRACT
This study aims to verify the approach of Critical Mathematics Education with the STS
approach. It involves a qualitative research, of the type pedagogical intervention, carried
out in a private school in the city of Curitiba, with students of the 1st year of High School,
using Problem Solving and Mathematical Modeling. The classes included activities on the
content of Arithmetic Progression, in the case of Problem Solving and on statistics,
percentage and exponential functions, regarding Mathematical Modeling. In addition to the
mathematical contents, the practice addressed themes related to the presence of
adolescents in academies, use of cell phones and their impact on the daily life of the human
being and effects of marijuana in the body. For the analysis of the approximations between
the methodologies used and the STS approach, the main characteristics of this approach, as
well as the stages proposed for its development, were searched in the literature. The
analysis showed that the Troubleshooting presented a sequence of reflections on the issues
present in the problem situations similar to the sequences indicated in STS approach. The
project carried out in Mathematical Modeling demonstrated a constant presence of
interdisciplinarity and contextualization, which are the necessary requirements for teaching
in the STS perspective. It was possible to establish some relations to a STS approach in both
Troubleshooting and Mathematical Modeling. It was noticed that the teacher's mediation
is what makes possible the appropriate directives so that the mathematical contents can
bring scientific and technological base for the performance of the student in the society.
KEYWORDS: STS. Problem Solving. Mathematical Modeling.
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Recebido: 08 ago. 2018
Aprovado: 13 abr. 2019
DOI: 10.3895/actio.v4n2.8668
Como citar:
ROCHA, F. S. M. da; LORENZETTI, L.; KALINKE, M. A. Aproximações entre Resolução de Problemas e
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Disponível em: <https://periodicos.utfpr.edu.br/actio>. Acesso em: XXX
Correspondência:
Flavia Sucheck Mateus da Rocha
Travessa Amapá, n. 26, Águas Belas, São José dos Pinhais, Paraná, Brasil. CEP: 83010-590.
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