Página | 63
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
http://periodicos.utfpr.edu.br/actio
Teoria dos Campos Conceituais: visitando
seus principais fundamentos e perspectivas
para o ensino de ciências
RESUMO
Débora Piai Cedran
depiai@yahoo.com.br
orcid.org/0000-0002-8222-968X
Universidade Estadual de Maringá (UEM),
Maringá, Paraná, Brasil
Neide Maria Michellan Kiouranis
nmmkiouranis@gmail.com
orcid.org/0000-0002-1279-9994
Universidade Estadual de Maringá (UEM),
Maringá, Paraná, Brasil
A Teoria dos Campos Conceituais, desenvolvida por Gérard Vergnaud (1933), filósofo,
matemático e psicólogo francês, é uma teoria cognitivista que se reporta à construção de
conceitos como fundamento principal. Para Vergnaud o conhecimento de um indivíduo se
constrói à medida que ele consegue estabelecer relações e conceitualizar determinadas
situações ou problemas. Tendo em vista esses pressupostos, o objetivo desta produção foi
traçar alguns fundamentos, trazidos por Vergnaud, que embasam a Teoria dos Campos
Conceituais, tais como: campos conceituais, conceitos, situações, esquemas, invariantes
operatórios e as representações. Para tal, foram consultadas suas produções iniciais e
atuais. Mais que os pressupostos, a Teoria dos Campos Conceituais se mostra relevante para
o entendimento dos processos de desenvolvimento dos conhecimentos científicos pelos
indivíduos, além de se constituir um bom referencial para o estudo, elaboração e
compreensão de práticas para o ensino de ciências.
PALAVRAS-CHAVE: Aprendizagem. Teoria do Conhecimento. Ensino de Ciências. Campos
Conceituais.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
TEORIA DOS CAMPOS CONCEITUAIS: VISITANDO SEUS PRINCIPAIS
FUNDAMENTOS
A Teoria dos Campos Conceituais (TCC), desenvolvida por Gérard Vergnaud
(1933), filósofo, matemático e psicólogo francês, é uma teoria cognitivista que se
reporta à construção de conceitos como fundamento principal. Para Vergnaud o
conhecimento de um indivíduo se constrói à medida que ele consegue estabelecer
relações e conceitualizar determinadas situações ou problemas, que necessitam
de teoremas de níveis diferentes (VERGNAUD, 1996a). Nesse sentido, a questão
da conceitualização perpassa não somente questões de caráter teórico, pensando
no verbo conceitualizar, mas se por meio de uma estreita dialetização entre o
empírico e o teórico e isso se evidencia não somente na construção dos conceitos
pelos sujeitos, mas também na construção histórica dos princípios (VERGNAUD,
1996a).
Dessa forma, a TCC “trata-se de uma teoria psicológica do conceito, ou
melhor, da conceitualização do real, que permite situar e estudar as filiações e
rupturas entre conhecimentos do ponto de vista de seu conteúdo conceitual”
(VERGNAUD, 1996a, p. 133, tradução nossa). Tem também como foco estruturar
princípios sobre a aprendizagem e desenvolvimento de competências que são
elaboradas em diversos âmbitos, como por exemplo, na escola e seu meio externo
(VERGNAUD, 1996a, 2009).
Assim, além de poder auxiliar na organização das intervenções pedagógicas, a
TCC tem como seus dois objetivos principais:
(1) descrever e analisar a complexidade progressiva, a longo e médio prazo,
das competências matemáticas que os alunos desenvolvem dentro e fora da
escola, e (2) estabelecer melhores conexões entre a forma operacional de
conhecimento, que consiste na ação no mundo físico e social e na forma
predicativa do conhecimento, que consiste nas expressões linguísticas e
simbólicas desse conhecimento (VERGNAUD, 2009, p. 83, tradução nossa).
Isto posto, a TCC se faz valer em um contexto em que várias proposições e
conceitos são previstos, de forma que, esta teoria possa ser compreendida e
significada nos contextos da educação. Tendo em vista esses pressupostos, o
objetivo desta produção, foi traçar alguns fundamentos, trazidos por Vergnaud,
que embasam a Teoria dos Campos Conceituais, como, campos conceituais,
conceitos, situações, esquemas, invariantes operatórios e as representações, e que
podem ser refletidos para os contextos da educação.
A PERSPECTIVA DOS CONCEITOS E DOS CAMPOS CONCEITUAIS
Um campo conceitual pode ser pensado, primeiramente, enquanto conceito,
como por exemplo, o da densidade. No entanto, a que se refere à ideia de
densidade? Seria possível explicá-la, usando uma definição em si própria, ou seja,
sem elementos que constituem outros conceitos? Assim, nos parece adequada a
utilização do termo “campos conceituais” quando nos referimos a um
fundamento, pois, um conceito nunca está isolado e sempre é formado em relação
a outros conceitos e situações (VERGNAUD,1982, 1996a, 2013a).
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Apesar da expressão campo conceitual nos remeter a noção de conceito,
Vergnaud (1982, 1996a, 2013a) assume que um campo conceitual pode ser
considerado em sua primeira premissa como um conjunto de situações, e
posteriormente é avaliado em termos de conceitos e teoremas. Essas instâncias
não devem ser pensadas como um processo, do qual o produto final é a
formalização dos conceitos, pois eles são desenvolvidos, mesmo que fragilmente,
por meio das situações (VERGNAUD, 2013a). Concomitantemente, infere que um
campo conceitual deve ser interpretado como “um conjunto de situações, cujo
domínio requer uma variedade de conceitos, procedimentos e representações
simbólicas, bem conectados uns com os outros" (VERGNAUD, 1982, p. 36, tradução
nossa).
Nesse caso, um campo de conceito é delimitado por vários conceitos definidos
socialmente e que são aplicados em diversos eventos por um indivíduo. Estes
conceitos, por sua vez, foram desenvolvidos por meio de circunstâncias passadas,
e serão necessários para compreensão de novas situações. Um campo conceitual,
portanto, pode ser pensado em termos de produção do conhecimento científico,
no que diz respeito aos problemas da ciência, bem como, advindo da produção
intelectual de qualquer indivíduo, procedente das situações cotidianas. Nesse
sentido, o próprio conceito de número nem existiria se o homem não tivesse
encontrado problemas de medição" (VERGNAUD, 1979, p. 264, tradução nossa), o
que demonstra o pensamento do autor referente a indissociação do
conhecimento, que, por fim, deve ser tomado como oriundo dos problemas gerais
encontrados.
Assim, para que essa ideia possa ser contextualizada, Vergnaud se utiliza de
alguns exemplos, dos quais, o mais presente em seus escritos é o campo conceitual
das estruturas aditivas (1982, 1996a, 2009, 2013b).
O campo conceitual das estruturas aditivas pode ser compreendido como um
agrupamento de situações às quais seja necessária a utilização de um conjunto de
conceitos e teoremas que permitam analisar tal problema no campo da adição,
formando um sistema, como por exemplo, “os conceitos de medida,
transformação, comparação, diferença e inversão, os conceitos de operações
unárias e binárias, os conceitos de função e a abscissa” (VERGNAUD, 1982, p. 36,
tradução nossa) entre outros.
Dessa forma, para cada campo conceitual deve ser atribuída uma classe de
situações, pois somente uma não seria suficiente para conferir significados ao
campo conceitual (VERGNAUD, 1982). Igualmente, uma situação não envolve
todos os conceitos pertinentes a um campo conceitual (VERGNAUD, 2009), assim,
não podemos considerar que o campo conceitual da adição, está restrito somente
a estes conceitos. Analogamente, assume que, para formulação de um campo
conceitual, é necessário considerar um amplo conjunto de eventos e conceitos,
que subsidiam o entendimento das filiações e rupturas provenientes do campo em
análise.
Embora um campo conceitual deva ser pensado como um conjunto extenso
de situações e conceitos, Vergnaud indica a importância da distinção entre os
campos conceituais, pois, apesar de poderem ser dependentes, devem ser
considerados distintos. Como exemplo, o campo densidade, é vinculado a outros
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
campos, como, massa, volume, proporcionalidade, entre outros, mas deve ser
pensado unicamente. Esse entendimento permite, segundo Grenier (2007),
- substituir um conceito por um conjunto de conceitos próximos;
- especificar as classes de problemas onde esses conceitos são ferramentas
de resolução (para especificar seus significados) (GRENIER, 2007, p. 3,
tradução nossa).
Ao passo que, um campo conceitual possa ser substituído por conceitos
próximos, a análise das parcelas (que podem ser de fundamentos mais simples),
pode facilitar a compreensão de campos mais complexos, além de tornar mais
acessível à promoção de situações que deem sentido aos problemas e campos em
desenvolvimento (SANTANA, 2012).
Por esse ângulo, Vergnaud (1996a) se refere a um conceito como um sistema
complexo formado por tantos outros conceitos, produzindo, assim, uma teia de
conhecimentos. Em relação à construção de conceitos por indivíduos, esses
conceitos são formulados à medida que o sujeito os significa através de situações
problemáticas, isso se devido ao fato de que todo conceito deve ser operacional,
pois, deve servir de sustentação para situações reais, ou seja, “deve ser pensado
ou explicado em termos de propriedades e relacionamentos” (VERGNAUD, 1979,
p. 264, tradução nossa).
Assim, um conceito não pode ser entendido como uma simples definição,
mesmo que a definição seja relevante para constituição do pensamento, e sim, por
conseguinte, como um tríplice conjunto distinto, mas dependente, S, I e L
(VERGNAUD, 1982, p. 36; 1996a, p.7; 2013b, p. 142), em que,
S: deve ser entendido como o conjunto de situações, que tornam o conceito
significativo;
I: deve ser compreendido como, o conjunto de invariantes operacionais, que
instituem o conceito e estruturam as formas de organização do pensamento,
e que serão evocados pelas situações;
L: deve ser concebido como o conjunto de representações linguísticas e
simbólicas que são usadas para retratar o conceito, suas propriedades e as
situações ao qual estão relacionados.
De acordo com Vergnaud (1998), a relação entre os invariantes (I) e as
situações (S), é a primeira fonte da conceitualização, pois, a formação de conceitos
implica na identificação de objetos, com suas propriedades, relacionamentos e
transformações, que podem ser manifestados pelo conjunto das representações
(L). Em outras palavras, a ideia de constituição de um conceito, pelos indivíduos,
sempre remeterá a associação destes conjuntos (S, I e L).
Como exemplo, podemos pensar no estabelecimento do conceito de
conservação em um processo. Para isso, uma série de situações será vivenciada
pelo sujeito, e estas situações evocarão invariantes, como, as primeiras
comparações de ordem global feitas pelas crianças, provocadas pela observação,
pelo manuseio, pela contagem não associativa, entre outros. Assim, S e I estão em
profunda relação, e as comparações globais podem ser ampliadas para paridades
mais restritas ao conceito, com a percepção de outros aspectos e problemas,
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
como, a manutenção ou não das quantidades, as variações decorrentes da
mudança da conformação dos objetos, entre outros.
Em contrapartida, as comparações de ordem global são estabelecidas em
conjunto com a linguagem natural dos indivíduos, como por exemplo, a linguagem
verbal e gestual, em que não se tem referência a nenhuma representação
simbólica mais específica, mas que marcam a inicialização do processo de
representação. Por conseguinte, os processos de representação, inseridos no ato
de pensar, podem também ser classificados como formas iniciais de elucidação dos
objetos e das situações.
Desse modo, para o conceito de conservação, o conjunto L, é construído,
mentalmente, por meio da constituição dos objetos e situações. Desta
constituição, circunstâncias como o “desaparecimento” e a associação direta dos
objetos a uma quantidade, ajudam a significar e retratar o conceito, bem como,
sua representação por meio de desenhos e números, que exigem então, uma
linguagem mais específica, diante do problema. Assim, indubitavelmente o
conjunto das representações (L) está intimamente relacionado com o conjunto dos
invariantes (I).
Logo, segundo Vergnaud (2007b), a ideia de conceito, composto por meio do
tripleto S, I e L, se remete a,
- não se pode estudar o desenvolvimento de um conceito isoladamente,
porque é sempre retirado de um conjunto, formando um sistema;
- a conceitualização é um processo que faz parte da atividade, e é necessário,
portanto, capturar as conceitualizações que operam nos esquemas, sejam
elas explícitas ou implícitas; Isto é o que me levou a dar tanta importância ao
conceito de invariante operatório (VERGNAUD, 2007b, p, 288, tradução
nossa).
Um conceito trata-se, portanto, do ato de enfrentar as situações, provocar os
invariantes e representar as situações e conceitos nela envolvidos, configurando
assim, a ideia de mobilidade para um fundamento.
OS ASPECTOSCONSTITUINTES DOS CONCEITOS NA TCC: AS SITUAÇÕES (S), OS
INVARIANTES (I) E AS REPREPRESENTAÇÕES LINGUÍSTICAS (L)
1- O conjunto das SITUAÇÕES
Segundo definição clássica, a palavra situação pode se remeter a uma classe
extensa de significados, como por exemplo, as condições de estado, conjuntura,
ocorrência. A ideia das situações coloca-se frente ao que acontece no real e para a
psicologia cognitiva, as situações têm papéis que vão além do campo do objeto e
do palpável, envolvendo uma relação estreita entre o real e o sujeito.
Nesse sentido, as situações são mais amplas do que sua definição usual, que
o desenvolvimento intelectual se dá por meio das situações, isto segundo a
perspectiva de Vergnaud, pois delas surgem novas ou mais complexas formas de
estrutura para os conhecimentos. Então, a concepção adotada é a de que “os
processos cognitivos e as respostas do sujeito são função das situações com as
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
quais eles se confrontam(VERGNAUD, 1996a, p. 171), assim, certifica-se a ideia
de que as situações são a porta de entrada para a formação de conceitos. Somado
a isto, as situações, são construtivas, pois, auxiliam não somente na interpretação
dos fatos, mas conduzem à transformação dos objetos em suas formas de
representação.
Em decorrência desta concepção, Vergnaud (1996a, 2009) caracteriza as
situações em dois tipos: de variedade e de história.
As situações de variedade contemplam as várias situações que fazem parte
de um campo conceitual, vivenciados por um indivíduo durante sua vida, como por
exemplo, uma tarefa diária, atividades escolares, entre outros. As situações de
variedade se enquadram, tanto em situações vivenciadas, como em novas,
encontradas em novos problemas, dessa forma, se somam e ajudam na construção
sistemática das classes de conceitos que se iniciaram. Assim, as situações de
variedade contemplam os acontecimentos que vem do meio de forma aleatória e
que constituem um conceito. Como exemplo disso, Vergnaud (1996a) indica que o
conceito de adição é formulado naturalmente pelas crianças ao vivenciar situações
como, comprar doces, pôr a mesa, separar um time para um jogo, pois, é
necessário que pensem em condições de comparação, número, transformação,
entre outras, relações estas necessárias para formulação do conceito em questão.
Já as situações de história se remetem a acontecimentos já dominados pelos
indivíduos, devido ao confronto das situações ao longo de sua vida. Nesse caso,
essas situações foram progressivamente coordenadas e são mais responsáveis
pela formulação concreta dos conceitos, isso devido ao fato de serem
circunstâncias vivenciadas com mais frequência e que, acima de tudo, foram
funcionais e verdadeiramente significativas para a conceitualização.
As situações de história também são relevantes na formulação de conceitos,
pois, auxiliam na ruptura a conhecimentos anteriores, ou na ampliação desses
conhecimentos, dependendo de quão significativa e problemática for a ocorrência.
Segundo Vergnaud (2013b, p. 147, tradução nossa) “o desenvolvimento manifesta-
se ao mesmo tempo através de continuações e de rupturas: o novo conhecimento
é construído e apoiado por conhecimentos prévios, e às vezes ao opor-se a eles”,
o que pode ser favorecido por meio dessas situações. Outra consideração
importante é que as situações de história fazem parte do desenvolvimento
pessoal, pois se remetem aos acontecimentos na individualidade, já que, as
relações com os objetos, pessoas, entre outros, são pertinentes aquela situação e
aquele indivíduo.
Apesar de serem acontecimentos individuais, Vergnaud (1996a) afirma que,
existem certas regularidades no tratamento de uma mesma situação pelas
pessoas, seja, nas concepções primitivas de análise da situação, na construção de
relações ou na observação de suas propriedades. Assim, as situações vivenciadas
são diferentes, mas formam um todo coerente para o desenvolvimento de um
campo conceitual para o indivíduo. Afirma ainda que, o que pode ser comum para
as pessoas seja os pontos de rupturas e continuidades para com os conhecimentos
anteriores, mesmo em situações diferenciadas (VERGNAUD, 1996a).
Dessa forma, para que um campo conceitual seja desenvolvido, é necessário
o enfrentamento de uma série de situações de variedade e de história, já que um
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
campo conceitual é sempre formado por um amplo conjunto de situações. Toda
situação conduz a conhecimentos de base ou a conhecimentos complexos.
2- A noção de ESQUEMAS e o conjunto dos INVARIANTES OPERATÓRIOS
Os esquemas complementam a ideia de situação e são fundamentais para a
compreensão da relação entre situações e desenvolvimento intelectual. Segundo
Vergnaud (1996a, 2007b, 2009, 2013b), um esquema é a organização invariante
de uma conduta para uma classe de situações apresentada. Assim, designa as
formas de organização das informações e ações, “e é estruturada por invariantes
operatórios, isto é, conhecimentos adequados para selecionar a informação e
processá-la” (PLAISANCE; VERGNAUD, 2003, p. 66).
Para Vergnaud (2013a), um esquema pode ter duas funções - organizar e
gerenciar ações em situações familiares, ou ainda, abordar e enfrentar situações
desconhecidas, ampliando as ramificações ao qual se aplica o esquema. Assim, os
esquemas se adaptam às situações e, durante o desenvolvimento cognitivo, são
ampliados a outras classes de situações.
Por consequência, novas situações, que possuam aspectos diferenciados,
auxiliarão na construção de novos esquemas. Para isso, os relacionamentos
existentes, entre esquemas, são evocados, ajustados ou ainda desenvolvidos para
a apropriação de novas situações (VERGNAUD, 2013a). Logo, para que haja a
formação/desenvolvimento de um esquema é necessária uma situação, no
entanto, esta pode ser compreendida se reportar-se às formas invariantes do
pensamento. Desta forma, a concepção de invariante operatório complementa o
estado da conceitualização, pois, eles são “os conhecimentos contidos nos
esquemas” (VERGNAUD, 1996a, p. 160, tradução nossa).
Originalmente a ideia dos esquemas foi proposto como base filosófica por
Kant (1724-1804) que os consideravam estruturas inatas para a organização de
nossa impressão da realidade (EYSENCK; KEANE, 2000). Dessa forma, um esquema
seria um produto de nossa imaginação, considerando dialética a relação do sujeito
em relação ao objeto. Com efeito, Kant (2001) considera que os conceitos não
estão assentados sob forma de imagem em nossas estruturas de pensamento e
sim sobre os esquemas.
Certamente a forma considerada por Kant sobre o entendimento, organizado
por esquemas, engendrou caminhos para que outros estudiosos considerassem
esta forma de organização dos conhecimentos adquiridos por meio de reflexões
sobre a experiência. No campo do desenvolvimento, Piaget (1896-1980) foi
influenciado pelas obras de Kant, empregando, dentre outros aspectos, o uso do
conceito de esquema para explicar o desenvolvimento cognitivo, em especial das
crianças. A noção de esquema para Piaget remete-se a uma associação de
conteúdos, que advém da relação entre a experiência (objeto) e o sujeito (PIAGET,
1973).
Assim, os esquemas são uma forma de organização do pensamento e são
utilizados para compreender o real, bem como agir sobre ele. Dessa forma, tem
como principal atribuição assegurar a incorporação de novas informações, de
maneira entrelaçada (entre esquemas) sobre novos objetos. Ademais, o “conteúdo
de cada esquema de ação depende em parte do meio e dos objetos ou
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
acontecimentos aos quais se aplica” (PIAGET, 1973, p. 18) e também das questões
internas do funcionamento biológico humano. Por consequência, Piaget (1973)
considera que os esquemas assumem posições hierárquicas e que são construídos
sucessivamente apoiados em diferenciações anteriores.
Apoiado nestas concepções, Vergnaud (1996b) considera como principal
contribuição de Piaget a ideia de esquema, proposto como condição para os
desdobramentos do conhecimento. Apesar disso, Vergnaud estende a
compreensão do conceito de esquema, propondo reflexões acerca das
proposituras de Piaget. Assim Vergnaud (2007a, 2007b, 2012, 2013a, 2013b)
assume algumas definições para a noção de esquema:
a) é um todo funcional dinâmico;
b) é uma organização invariante da conduta para um determinado tipo de
situação;
c) é composto necessariamente por quatro ingredientes - objetivos,
submetas e expectativas; regras para gerar ação, busca de informação e
controle de decisões; invariantes operatórios (teoremas-em-ação e
conceitos-em-ação); possibilidades de inferência.
No tocante à primeira definição, Vergnaud assinala a relação de sua definição
com a de Piaget. Indica, assim, que os esquemas assumem a dinamicidade da
reflexão na construção dos conhecimentos. Preliminarmente, um esquema é dito
dinâmico, pois é dependente das situações as quais o sujeito se depara. Dessa
forma, os esquemas são responsáveis por acomodar e generalizar novas
informações (VERGNAUD, 1991). Por conseguinte, nosso relacionamento com a
realidade, mais exatamente as situações, nos obriga a evoluir e constituir novos
esquemas, portanto, os esquemas são considerados por Vergnaud (1996a, 1991,
2013a) flexíveis, o que permite adotá-los em circunstâncias variadas em uma
mesma classe de situações.
Um esquema também é dito ativo, pois a aprendizagem e o desenvolvimento
cognitivo promovem a ampliação de um esquema. Isso porque, os esquemas são
combinados, descombinados e recombinados para formar novos esquemas, são
ainda, simplificados, reduzidos ou automatizados quando certas partes dos
esquemas já se tornaram familiares e são controladas apenas por outras variáveis
das situações (VERGNAUD, 1991).
Nesse caso, as condições indicadas são provindas de dois tipos de situações:
as dominadas e as novas situações (VERGNAUD, 1996a). No primeiro caso, o
sujeito dispõe em seu repertório, esquemas para o tratamento imediato da
situação, assim, eles podem ser simplificados, reduzidos ou automatizados. Já em
situações novas, são utilizados muitos esquemas, que são estendidos a esta nova
classe de situações, ou ainda, que são renegados, antes mesmo da constituição de
uma ideia. No fundo sempre são os esquemas os evocados para resolução de uma
situação. Mesmo os fracassos mostram alguns esquemas que supostamente
foram, de maneira frustrada, usados pelo indivíduo (VERGNAUD, 1996a).
Ainda com relação ao caráter dinâmico de um esquema, seu aperfeiçoamento
advém de situações que podem acarretar em filiações e rupturas com relação a
conhecimentos anteriores. O autor indica que ambos os casos são relevantes para
o desenvolvimento de um esquema, que conceitos prévios auxiliam na
compreensão de novos conceitos quando estes são compatíveis e
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
complementares, daí a ideia de filiação ou continuidade. Estes conceitos são
construídos de forma a aumentar as ramificações e, assim, sua amplitude. Por
outro lado, em outros momentos as rupturas se fazem necessárias, que ao
interpretar novas situações o sujeito pode se deparar com fatos que
contraponham suas ideias atuais. Nesse caso, é por meio de uma ruptura que o
desenvolvimento ocorre. Assim, o desenvolvimento de um esquema se por
meio de filiações e rupturas, entre a dialética do antigo e do novo (VERGNAUD,
2013b).
Com relação à segunda definição, Vergnaud (1996a, 1991, 1998, 2007a,
2007b, 2009, 2013a, 2013b) considera um esquema como uma organização
invariante da conduta para um determinado tipo de situação. Os esquemas são
necessários em todas as ações, sejam elas automatizadas ou refletidas. Enquadra-
se em um amplo escopo como andar, falar, escrever um discurso, planejar uma
atividade, resolver problemas escolares (VERGNAUD, 1991).
Sendo assim, os esquemas são modificados à medida que nos deparamos com
determinadas situações, no entanto, são invariantes frente às organizações das
condutas. Quando uma situação se encontra dominada, é neste ponto que os
esquemas são efetivamente evocados, ou seja, os esquemas necessários a resolver
aquela classe de situações (VERGNAUD, 1996a). Plaisance e Vergnaud (2003, p. 66)
sinalizam que os primeiros esquemas de um indivíduo são “perceptivo-gestuais,
isto é, maneiras de organizar a tomada de informação e ação para agir sobre os
objetos, em função de certa intenção ou de um objetivo a atingir”. Neste caso, a
necessidade em andar, por exemplo, fará com que o sujeito organize informações
e maneiras de agir, para realizar a tarefa.
Analogamente, o que se torna invariável não são as condutas observáveis, pois
elas resultam das situações, mas, sim, a sua organização (VERGNAUD, 2007a,
2007b, 2012, 2013a, 2013b). À vista disso, um sujeito não necessariamente teas
mesmas ações ao andar, pois dependerá da intenção, local, para onde desejara ir,
mas a sua forma de organização interna, quanto a levantar as pernas, mover-se,
entre outros, será invariável, caso contrário, necessitaria construir todos os dias as
mesmas operações.
A princípio estes esquemas vão se constituindo em decorrência da
necessidade (daí o caráter funcional e dinâmico). No entanto, na medida em que
determinada situação torna-se dominada, pode-se dizer que o esquema referente
àquela situação está constituído, ou seja, torna-se invariante frente à organização
da conduta (VERGNAUD, 2009). Isso o implica que um esquema nunca será
modificado, mas que a modificação é dependente da ocorrência de uma nova
situação. Assim Vergnaud afirma:
[...] um esquema não é um estereótipo, mas uma função temporizada com
argumentos, que permite gerar sequências diversas de ações e de tomada de
informação, em função dos valores das variáveis da situação. Um esquema é
sempre um universal, porque se encontra associado a uma classe e, por outro
lado, porque esta classe não está, em geral, acabada (VERGNAUD, 1996a, p.
163).
Para além da ideia de invariação da organização da conduta, mas ainda
considerando a segunda definição de esquema, este pode ser utilizado para um
determinado tipo de situação, ou melhor, para uma classe de situações
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
(VERGNAUD, 2013a). Esta classe pode ser grande ou pequena ou, ainda, pode ser
inicialmente pequena e depois expandida (VERGNAUD, 2007a). Isso não deve
denotar a ideia de que um único esquema para uma classe de situações, pois,
muitas vezes, a situação requer um montante de esquemas (VERGNAUD, 1996a,
2013b). Assim, quando um sujeito se depara com situações as quais necessite
fazer, por exemplo, uma quantificação (classe de situações), sempre requererá
determinados esquemas, considerando aqui, uma variedade deles.
Ponderadas as ideias de invariação da organização da conduta para uma classe
de situações, a terceira definição configura os ingredientes dos esquemas e
permite, consequentemente, compreendê-los analiticamente. Assim, os
esquemas são constituídos de quatro elementos: objetivos, submetas e
expectativas; regras para gerar ação, busca de informação e controle de decisões;
invariantes operatórios (teoremas-em-ação e conceitos-em-ação); possibilidade
de inferência.
Os objetivos indicam os primeiros intuitos do sujeito, isso implica em
considerar que um esquema não pode ser definido somente pela ação, mas
também, como reflexão frente às necessidades. São promovidos, também, pelas
situações e podem ser negociados com outras pessoas. Os objetivos são, portanto,
a parte intencional dos esquemas, e são indispensáveis para a organização da ação.
Para fomentá-las (ação), os propósitos podem ser decompostos em submetas que
são geridas, antes ou durante o processo, o que constitui possíveis expectativas
(VERGNAUD, 2013b).
as regras para gerar ação são as componentes geradoras dos esquemas
(VERGNAUD, 1996b, 2007a, 2013b) e são condicionadas pelos objetivos. Porém,
não criam a ação, mas, toda a atividade do sujeito, o que inclui gerenciar,
coordenar, buscar e controlar as informações. Também permitem o controle da
ação, de modo a possibilitar o alcance do objetivo. São responsáveis em assegurar
o processo regulatório dos esquemas (VERGNAUD, 1996b, 2007a).
Também por consequência da regulação destas regras, Vergnaud (2012),
assinala que os esquemas são formados progressivamente, considerando a ideia
das filiações, e que, não somente as ações observáveis, mas também, a busca por
informações e controle das decisões, é organizada por este ingrediente. Ademais,
esta regulação permite, inclusive, mudanças na condução da ação, envolvendo a
concepção das rupturas.
Assim, as regras para gerar ação, são responsáveis por tornar os esquemas
coerentes em suas conexões, de modo a garantir seu funcionamento. Todavia,
como as situações são a “porta de entrada” para a conceitualização, as regras são
condicionadas, pelas metas, expectativas e objetivos lançados pelas situações e
necessidades do sujeito (VERGNAUD, 2013b). Para tanto, é necessário identificar
objetos, seus atributos e correlações, o que se torna possível, por meio da
conceitualização. Assim, a ideia do conhecimento processual pode ser estendida,
pois, para Vergnaud (2012, p. 291, tradução nossa),
(...) não é o conceito de sucessão regular o único que pode ajudar
compreender as razões que vinculam as diferentes condições possíveis e as
diferentes atividades associadas a elas. Existem relações conceituais entre
condições e atividades.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Dessa forma, tanto metas e objetivos, quanto as regras para gerar ação são
possíveis devido às conceitualizações feitas sobre objetos e situações. É este
argumento, utilizado por Vergnaud, que introduz aos esquemas os “componentes
epistêmicos” (VERGNAUD, 2012, p. 291), conceitos-em-ação e teoremas-em-ação,
ou invariantes operatórios.
Os invariantes operatórios são ditos componentes constantes dos esquemas,
e são construídos no decorrer do tempo. Assim, para os indivíduos uma noção
pode ser variável, mas à medida que ele consegue desenvolver os esquemas
referentes aquele conceito, a concepção se torna invariável (VERGNAUD, 1982).
Por exemplo, para uma criança parece ser condizente que se tenha diferentes
volumes de um líquido quando ele é transportado de um copo para outro, com
diferentes diâmetros, para o adulto essa percepção se mostra irrelevante, pois
é permanente. Isto posto, os invariantes operatórios são encarados, pelos sujeitos,
como propriedades óbvias das situações (VERGNAUD, 1982), devido ao processo
de conceitualização, assim, dificilmente são modificados.
Considerando esta perspectiva, os significados repousam sobre os invariantes
operatórios (VERGNAUD, 1991), o que implica dizer que as conceitualizações
podem estar implícitas nos esquemas e que nos esquemas é possível encontrar os
conhecimentos-em-ação (VERGNAUD, 1996a). Assim, Vergnaud (1996b) infere
que nos invariantes é possível encontrar a base conceitual implícita ou explícita.
Esta base conceitual é que permite o processamento das informações que são, de
fato, pertinentes, possibilitando as inferências e interpretações. Dessa forma,
somente com a integração dos invariantes é que os objetivos, expectativas e regras
para gerar ação passam a ser válidos. Assim, assinala Vergnaud (2007a, p. 7,
tradução nossa),
A principal função dos invariantes operacionais é coletar e selecionar
informações relevantes e inferir consequências úteis para ação, controle e
posterior captura de informações. É então uma função de conceitualização e
inferência.
Para cada situação um sujeito tem vários conhecimentos possíveis. Para
identificar os objetos e possibilitar relações, são necessários os invariantes, em que
repousam as bases conceituais da cognição. Estes conhecimentos podem ser
divididos em duas classes: conceitos-em-ação e teoremas-em-ação.
Os conceitos-em-ação são ditos categorias de pensamento consideradas
pertinentes ou não (VERGNAUD, 1996b, 1998, 2013a, 2013b), assim, alguns
possuem status de objeto, outros de predicados (VERGNAUD, 2013b). Entende-se
por objeto, tanto as coisas materiais perceptíveis” como os “objetos construídos
pela cultura, ciência, tecnologia ou pelo mesmo sujeito individual” (VERGNAUD,
2013b, p. 153, tradução nossa), enquanto os predicados podem ser
compreendidos como propriedades dos objetos observáveis ou inferidas por meio
das elaborações culturais. Como exemplo, pode-se pensar nos conceitos de
velocidade, temperatura, tempo, termômetro, transformação, mol, pressão, que
serão considerados tocantes ou não a situação. No entanto, um conceito-em-ação,
se objeto ou predicado, não possibilidades de inferência, como aponta
Vergnaud (2007b), pois não são passíveis de questionamento. Nesse sentido, as
relações são possíveis por meio dos teoremas-em-ação.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Os teoremas-em-ação são tomados, dessa forma, como proposições sobre o
real, que são defendidas como verdadeiras pelos indivíduos (VERGNAUD, 1996b,
2009, 2012, 2013a, 2013b), dessa forma, são espontaneamente usados e podem
estar certos ou equivocados do ponto de vista dos conhecimentos aceitos
culturalmente (VERGNAUD, 2012). Nesse caso, pode-se ter os conceitos-em-ação,
como exemplo, pressão, volume e temperatura, que são julgados pertinentes ou
não, no entanto, ponderar sobre o aumento da pressão, quando se diminui o
volume de um recipiente, com temperatura constante, depende de um teorema,
ou ainda, considerando uma situação, um teorema-em-ação.
Por outro lado, os teoremas-em-ação são desenvolvidos durante um longo
período de tempo, requerendo teoremas de níveis diferentes (VERGNAUD, 2009),
assim, relacionamentos como, a pressão depende da temperatura, podem ser
considerados de complexidade menor, no sentido de envolver dois conceitos,
quando comparados ao caso anterior (pressão, volume e temperatura). Também
alguns teoremas-em-ação podem ser específicos, enquanto outros podem ter
características mais universais e serem usados em várias situações pelos sujeitos
(VERGNAUD, 2007, 2013b).
Por certo, Vergnaud (1982, 1991, 2012) concebe que os teoremas-em-ação
são a forma pela qual se possa fazer inferências sobre a realidade. Para o autor
(2012), não ação sem teoremas-em-ação, ou seja, sem assegurar problemas
reais com a realidade, o que possibilita o caráter adaptativo e operacional nos
esquemas (VERGNAUD, 1991).
Em decorrência da proposta de que não ação sem teoremas-em-ação,
Vergnaud (1982, 1998, 1991, 2007b) considera que os teoremas-em-ação, são na
maioria das vezes implícitos, ou seja, nem sempre são conscientes. Pondera, por
consequência, que, em cada ação, selecionamos uma parte muito pequena das
informações disponíveis (VERGNAUD, 1998). Com isso, a título de exemplo,
sabemos, naturalmente, que um recipiente fechado pode estourar, com o
aumento da temperatura, no entanto, este teorema-em-ação, pode manter-se
sem a necessidade de maiores explicações, mas caso o sujeito procure justificativas
da ocorrência, pode então, fazer-se explícito o teorema-em-ação. Quando se
tornam conscientes ou explícitos, os teoremas-em-ação podem tornar-se
verdadeiros teoremas científicos (VERGNAUD, 1979, 1991), pois são apresentados
e dialogados com outros indivíduos.
O autor pondera ainda que, o que de fato é conceitualizado se torna explícito
(VERGNAUD, 1991), logo, os teoremas-em-ação podem se converter em teoremas
científicos se forem conceitualizados, isto é, necessitam inicialmente serem
percebidos, e por consequência, refletidos, expressados, ponderados e
significados em diversas circunstâncias. Também em virtude da característica
tácita dos teoremas-em-ação, muitos dos erros e dificuldades apresentados pelos
sujeitos são demarcados pelos processos de conceitualizações internas, que, por
hora, são insuficientes do ponto de vista científico (VERGNAUD, 1991).
Considerando que não existe ação sem teoremas-em-ação, e que não há ação
sem objetos e predicados, Vergnaud (1996a, 2007a, 2007b, 2009) reitera que a
relação entre teoremas-em-ação e conceitos-em-ação é dialética e indissociada.
Para ele,
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
A relação entre teoremas e conceitos é obviamente dialética, na medida em
que não teoremas sem conceitos e nem conceito sem teoremas.
Metaforicamente, podemos dizer que os conceitos-em-ação são os tijolos
com os quais os teoremas-em-ação são feitos e que o único motivo para a
existência dos conceitos-em-ação é precisamente permitir a formação de
teoremas-em-ação (proposições verdadeiras), das quais são possíveis a
organização da atividade e as inferências. Reciprocamente, os teoremas são
constitutivos de conceitos, pois, sem proposições verdadeiras, os conceitos
ficariam vazios de conteúdo (VERGNAUD, 2007a, p. 8, tradução nossa).
Isto posto, citando nosso exemplo, a relação entre o recipiente que estoura e
a dependência da pressão em função da temperatura, que são possíveis teoremas-
em-ação depende da construção dos conceitos-em-ação, como recipiente,
temperatura, “estouro”, pressão, termômetro etc. Sem a significação desses
conceitos-em-ação não seria possível conceber as relações e inferências, ao passo
que, sem os teoremas-em-ação, não seria possível ao menos compreendê-los em
uma ação.
Salienta-se que os invariantes operatórios estão ligados aos objetivos, regras
para gerar ação, pois são responsáveis por agregar os conteúdos pertinentes das
situações. Todavia, o que propicia compreender que um esquema não é um
estereótipo é seu último ingrediente: possibilidades de inferências.
A possibilidade de inferência oportuniza entender que um esquema é fruto da
intensa atividade dos sujeitos (VERGNAUD, 1991, 2007b, 2009, 2013b) e que são
regulados por adaptações, controles e ajustes graduais (VERGNAUD, 2007a).
Permitem, dessa forma, a criação de inferências, do tipo, “então… se...”, antes,
durante e depois dos acontecimentos. Como consequência, Vergnaud (2007a)
certifica que dificilmente uma ação é realizada sem a saída de novas informações,
mesmo que sejam automatizadas e, por conseguinte, as inferências propiciam a
escolha de uma alternativa entre várias, dependendo das vantagens e
desvantagens encontradas (VERGNAUD, 2013b).
Os ingredientes de um esquema constituem, desse modo, uma forma
integrativa de pensar a sua construção. Não é possível conceber os invariantes
operatórios, que, segundo Vergnaud, são um dos componentes de maior
representatividade nos esquemas, se os meios de regulação, entrada e controle
das informações não se mostrarem funcionais.
Os esquemas, segundo Vergnaud, de fato se diferenciam e se estendem em
relação ao conceito de esquema para Piaget. Nesse sentido, além da relação entre
os objetos e o sujeito na constituição dos esquemas, é necessário considerar que
conceitos e teoremas também estão contidos nos esquemas, ou seja, esquemas
matemáticos (considerando a perspectiva de Vergnaud), ou, ainda, esquemas
explicativos da ciência. Também há que se considerar que existem esquemas, que,
para Vergnaud (1998), são tão importantes quanto os perceptivos-gestuais e
matemáticos - os esquemas verbais e sociais.
De fato, esses esquemas se combinam para resolver uma classe de situações.
A resolução de um problema coletivo, como, por exemplo, um exercício de
química, exige que vários esquemas se façam necessários como, negociações,
esclarecimentos, sistematizações, redações, cooperações, entre outros, o que
torna imprescindível a discussão sobre o conjunto L, das representações
linguísticas e simbólicas.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
3- O conjunto das REPRESENTAÇÕES
Vergnaud (2007a, 2009, 2012, 2013a) apresenta quatro significados distintos
para o conceito de representação, mas que, segundo sua ótica, são
interdependentes:
Significado 1 A representação é fluxo da consciência, pois é manifestada por
meio da percepção e da imaginação. A percepção consiste na identificação de
objetos e relacionamentos que dependem das experiências e interesses de cada
um, como, por exemplo, a vivência da escola. Mesmo com espaços comuns, o
entendimento dos alunos será diferente dos professores, que, por sua vez, será
diferente da dos pais dos alunos.
Mas além da percepção, Vergnaud (2013a) considera que a imaginação
também é derivada do fluxo da consciência, que nem todos os objetos são
inteiramente materializados, ou seja, perceptíveis, como no caso dos frutos
derivados dos objetos construídos pela ciência, como o conceito de átomo, gene,
força, e muitos outros. Ainda, segundo o autor (2007a), a consideração de que a
representação é fluxo da consciência é a sua evidência mais direta como um
fenômeno psicológico.
Significado 2 A representação é um sistema de conceitos. Vergnaud (2007a)
considera que a representação é estruturada por conceitos. Não é possível
imaginar, falar sobre um objeto ou representá-lo por meio de figuras sem
conceitos, mesmo que prévios, sobre ele. A formalização deste sistema de
conceitos é de responsabilidade dos invariantes operatórios, que são os
componentes epistêmicos dos esquemas. Nesse sentido, a representação pode ser
explícita ou implícita e está, novamente, vinculada às ões dos indivíduos, pois,
não existe ação e percepção sem os invariantes. Isto posto, o autor fundamenta
este segundo significado, por meio do entendimento que se faz de um símbolo, ou
qualquer tipo de linguagem.
Assim, as representações funcionam em qualquer caso como substitutos
computáveis para a realidade e, portanto, são constituídos por teoremas-em-ação:
proposições que são consideradas verdade” (VERGNAUD, 1998, p.174, tradução
nossa). A forma como um aluno interpreta o sinal de igualdade, por exemplo, pode
ser diferente do que é pensado pelos matemáticos (VERGNAUD, 1982), o que está
relacionado diretamente com os invariantes operatórios, ou seja, os conceitos e
teoremas desenvolvidos na ação pelo sujeito.
Significado 3 A representação é um sistema de significantes e significados.
Para Vergnaud (1996a) são as situações que dão sentido a um conceito. No
entanto, o significado não está nos próprios eventos. Por outro lado, considera que
o sentido não está nos símbolos e nas palavras e sim na relação entre o sujeito, a
situação e os significantes (linguagem natural e os outros simbolismos).
Consequentemente entende que a relação entre situações e esquemas é a
primeira fonte de representação, o que se por meio dos invariantes operatórios,
na “identificação dos objetos, com suas propriedades, relacionamentos e
transformações” (VERGNAUD, 1998, p. 177, tradução nossa). Aos invariantes, se
depreende, dessa forma, a responsabilidade dos significados nas situações, que
serão mediados por meio da linguagem ou qualquer sistema de significantes.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
O vínculo, por conseguinte, entre sujeito (invariantes operatórios), situações
e significantes é considerado tão enredado que “quando os invariantes
operacionais são expressos e envolvidos em sistemas de conceitos e símbolos, o
seu estado cognitivo muda, até o ponto em que os esquemas podem às vezes
tornam-se algoritmos” (VERGNAUD, 1998, p. 176, tradução nossa). Assim, a
função dos significantes (linguagem natural e símbolos) é de facilitar o processo de
efetivação dos invariantes operatórios, portanto da conceitualização. Por outro
lado, Vergnaud (1991) considera que, não é possível pensar em automatização da
linguagem e das representações simbólicas, quando a conceitualização não foi
iniciada, pois não existe enunciado ou representação do que não foi previamente
pensado.
Logo, a representação é um processo dinâmico (VERGNAUD, 1998), e, em vista
disso, não podem ser ponderadas como fotocópias da realidade, tanto do que
pensa um indivíduo como em relação aos objetos. Dessa forma, cada pessoa pode
apresentar ou compreender um sistema de significantes de forma diferenciada das
de outros sujeitos, o que justifica o fato de um mesmo problema/situação ter
múltiplas interpretações e variadas formas de ilustração.
Com o objetivo de auxiliar na compreensão de que as representações são um
sistema de significantes e significados e que este processo é dinâmico e pessoal,
Vergnaud (2013a) recorre a variados exemplos, considerando a problemática das
fórmulas que são usadas em química, física, matemática, entre outros. Para ele, as
fórmulas possuem dupla relevância. Primeiro porque carregam intrinsecamente
suas variáveis ou constantes e suas devidas operações e, também, porque
possibilitam diferentes usos e leituras.
Assim, para o volume de um prisma, V = A. h, “podemos ter várias leituras
desta fórmula, bem como, usos distintos que podem ser conceitualmente
diferentes” (VERGNAUD, 2013a, p. 54, tradução nossa). Por meio dela, somos
capazes de calcular o volume, a altura ou a área de superfície da base,
considerando todas as operações matemáticas envolvidas. Também podemos
pensar nas relações proporcionais como “o volume é proporcional à altura quando
a área de superfície da base é considerada constante, e para a superfície da base
quando a altura é constante” (VERGNAUD, 2013a, p. 54, tradução nossa).
Em vista disso, são possíveis diferentes interpretações e aplicações para uma
única rmula e cada uma delas dependerá da configuração ou complexidade da
conceitualização por parte do sujeito, ou seja, da relação entre o indivíduo
(invariantes), os sistemas de significados e as situações.
Significado 4 A representação é um sistema de esquemas. As
representações podem ser compreendidas como produtos da ação e percepção
(VERGNAUD, 2009) e também auxiliam na regulação e organização desse
movimento. Nesse sentido, devem ser abrangidas em todos os aspectos referentes
aos esquemas, ou seja, não somente aos invariantes operatórios, pois, não
esgotam todo o seu conteúdo (VERGNAUD, 2012).
Por estas considerações, os esquemas são, segundo Vergnaud (2012), os
responsáveis pela percepção, ação e imaginação e estes processos envolvem,
necessariamente, o uso das representações linguísticas e simbólicas. É por meio
das expressões do pensamento que se torna possível traçar objetivos, formalizar
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
regras para gerar ação e propor inferências, pois permitem a simulação da
realidade, portanto, ajudam a conceituá-la (VERGNAUD, 2007a).
TEORIA DOS CAMPOS CONCEITUAIS: ALGUMAS PERSPECTIVAS PARA O ENSINO
DE CIÊNCIAS
Em virtude do processo de conceitualização que se pela relação entre os
invariantes (I) e as situações (S) e que podem ser manifestados pelo conjunto das
representações (L), Vergnaud (2007b) indica a importância de outros sujeitos nos
processos de mediação, por meio de proposições de novas condições de
aprendizagem. Nessa perspectiva, Plaisance e Vergnaud (2003) afirmam que, tanto
os pais quanto os professores têm papel formador das situações que podem
despertar interesse, pois podem intervir na escolha das situações e problemas a
ser solucionados. De fato, situações enriquecedoras podem facilitar o
desenvolvimento de esquemas, ou ainda, promover conflitos de forma que
esquemas existentes se adaptem a novas situações.
Considerando essa perspectiva, no que diz respeito à TCC e o ensino de
ciências vários autores vislumbraram o potencial das situações mediadas por uma
teoria de interpretação cognitiva. Dentre os campos e situações contemplados
encontramos, por meio da análise detalhada de artigos dos últimos dez anos que
se enquadraram em periódicos qualificados em A1 e A2 (área de avaliação -
ensino), categorizados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES), referente ao quadriênio 2013-2016, pesquisas voltadas,
especialmente, para a compreensão de conceitos em física, focados na aplicação
de situações de aprendizagem e análise dos invariantes operatórios, como
indicado no Quadro 1 Neste âmbito, os trabalhos foram desenvolvidos, não
somente como episódios de ensino para os campos em questão, mas também para
compreender os processos de aprendizagem desses campos conceituais.
Quadro 1 - Artigos publicados dos anos 2007 a 2017 sobre a TCC
Título artigo
Área
Conceitos da
TCC
Referência
Da teoria dos campos
conceituais à didática
profissional para a
formação de professores:
contribuição da psicologia
e da sociologia para a
análise de práticas
pedagógicas
Formação
de
professore
s
-Esquemas
-Situações
ACIOLY-RÉGNIER, N. M.;
MONIN, N. Educação
Unisinos, v. 13, n. 1, p. 5-
16, janeiro/abril 2009.
Utilização de um
dispositivo pedagógico
tecnológico híbrido na
formação de professores
na França
Formação
de
professore
s
-
Competências
-Conceitos
-Situações
ANDRADE, P. V. C. C.;
ACIOLY-RÉGNIER, N. M.
Educação Unisinos, v. 20,
n. 1, p. 117-128,
janeiro/abril 2016.
As equações matemáticas
no ensino de Física: Uma
análise de conteúdos em
livros didáticos de Física
Física
-Processo de
conceitualizaç
ão
ANJOS, A. J. S.;
SAHELICES, C. C.;
MOREIRA, M. A. Revista
Electrónica de Enseñanza
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Título artigo
Área
Conceitos da
TCC
Referência
-Conjunto de
representaçõe
s simbólicas
-Situações
de las Ciencias, v. 14, n.
3, p. 312-325, 2015.
Concepções e dificuldades
dos professores de Física
no campo conceitual da
modelagem científica
Modelage
m
-Dificuldades
-Campo
conceitual
BRANDÃO, R. V.;
ARAUJO, I. S.; VEIT, E. A.
Revista Electrónica de
Enseñanza de las Ciencias
, v. 9, n. 3, p. 669-695,
2010.
Evaluación del aprendizaje
de interferencia y
difracción de la luz en
ellaboratorio de física
Física
-Situações de
aprendizagem
BRAVO, S.; PESA, M.
Investigações em Ensino
de Ciências, v. 21, n. 2, p.
68-104, 2016.
Los conceptos de sistema
y equilíbrio em elproceso
de enseñanza/aprendizaje
de laMecánica y
Termodinámica. Posibles
invariantes operatorios.
Física
-Obstáculos de
aprendizagem
-Invariantes
operatórios
-Situações
COVALEDA, R.; MOREIRA,
M. A.; CABALLERO, M. C.
Revista Electrónica de
Enseñanza de las
Ciencias, v. 8, n. 2, p.
722-744, 2009.
La comprensión de
lasituación física en
laresolución de
situaciones problemáticas.
Un estúdio em dinámica
de las rotaciones.
Física
-Invariantes
operatórios
-Situações
-Ações e
esquemas
ESCUDERO, C.; JAIME, E.
A. Revista Electrónica de
Enseñanza de las
Ciencias, v. 6, n. 1, 2007.
Conocimientosen
acción: un estudio acerca
de laintegración de
lasfuerzas y la energia en
cuerpo rígido
Física
-
Representaçõ
es
-Invariantes
operatórios
-Situações
ESCUDERO, C.; JAIME, E.
Investigações em Ensino
de Ciências, v. 14, n. 1, p.
115-133, 2009.
Teoremas-en-acto y
conceptos-en-actoen dos
situaciones relativas
alanoción de sistema
cuántico
Física
-Situações
-Teoremas-
em-ação
FANARO, M. D. L. Á.;
OTERO, M. R.; MOREIRA,
M. A. Revista Brasileira
de Pesquisa em Educação
em Ciências, v. 9, n. 3,
2009.
Avanços e retrocessos dos
alunos no campo
conceitual da
Termodinâmica
Física
-Situações
-Esquemas
-Invariantes
operatórios
GRINGS, E. T. D. O.;
CABALLERO, C.;
MOREIRA, M. A. Revista
Electrónica de Enseñanza
de las Ciencias, v. 7, n. 1,
p. 23-46, 2008.
Uma proposta didática
para abordar o conceito
de temperatura a partir de
situações, à luz da teoria
dos campos conceituais de
Vergnaud
Física
-Invariantes
operatórios
-Símbolos
GRINGS, E. T. D. O.;
CABALLERO, C.;
MOREIRA, M. A. Revista
Brasileira de Ensino de
Ciência e Tecnologia, v. 1,
n. 1, p. 1-21, jan./abr.
2008.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Título artigo
Área
Conceitos da
TCC
Referência
Aprendizaje de los
conceptos de fuerza y
energia en estudiantes de
ingeniería: un estúdio
exploratorio
Física
-Situações
-Invariantes
-Esquemas
HENRÍQUEZ, A. L.;
JIMÉNEZ-GALLARDO, C.;
DÍAZ-PINTO, W. L. Revista
Electrónica de
Investigación en
Educación en Ciencias, v.
8, n. 1, p. 14-23, Junio
2013.
O problema dos teoremas-
em-ação sobre a força de
atrito na disciplina de
física geral para graduação
Física
-Teorema-em-
ação
-Situações
HILGER, T. R.; OLIVEIRA,
Â. M. M. Revista
Brasileira de Ensino de
Ciência e Tecnologia, v. 5,
n. 1, p. 54-70, jan./abr.
2012.
El trabajo experimental
como posible generador
de conocimiento en
enseñanza de la física
Física
-Situações
JAIME, E. A.; ESCUDERO,
C. Enseñanza de las
Ciencias, v. 29, n. 3, p.
371-380, 2011.
Implementación y
evaluación de una
propuesta de enseñanza
para el tópico física de
partículas en una
disciplina de estructura de
la matéria basada en la
teoría de los campos
conceptuales de Vergnaud
Física
-Situações
KREY, I.; MOREIRA, M. A.
Revista Electrónica de
Enseñanza de las
Ciencias, v. 8, n. 3, p.
812-833, 2009.
Cognitive Analysis When
the Students Solve
Problems
Química
-Situações
-
Representaçõ
es
LEDESMA, E. F. R. A
Cognitive Analysis When
the Students Solve
Problems. Creative
Education, v. 3, n. 4, p.
400-405, 2012.
Teoremas-em-ação e
Conceitos-em-ação na
Física aplicada à Medicina
Física
-Teoremas e
conceitos-em-
ação
-Situações
PARISOTO, M. F.;
MOREIRA, M. A.; MORO,
J. T. Ensino, Saúde e
Ambiente, v. 6, n. 3, p.
114-128, Dezembro
2013.
Modelo ondulatório como
estratégia de promoção da
evolução conceitual em
tópicos sobre a luz em
nível médio
Física
-Situações
-Conceitos e
teoremas-em-
ação
-Invariantes
operatórios
SILVA, J. D. A.; SOUZA, C.
M. S. G. Ciência e
Educação, v. 20, n. 1, p.
23-41, 2014.
Etnofísica, modelagem
matemática, geometria.
Tudo no mesmo Manzuá
Física
Matemátic
a
-Invariantes
operatórios
SOUZA, E. S. R. Revista
Amazônia - Revista de
Educação em Ciências e
Matemática, v. 9, n. 18,
p. 99-112, jan-jun 2013.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Título artigo
Área
Conceitos da
TCC
Referência
Un modelo para analizar
las interacciones
discursivas en clases de
Física
Física
-Processo de
conceitualizaç
ão
STIPCICH, S.; MOREIRA,
M. A.; CABALLERO, C.
Revista Electrónica de
Investigación en
Educación en Ciencias , v.
2, n. 1, p. 1-22, Julio
2007.
Fonte: autoria própria (2017).
Assim, com base na discussão levantada no decorrer deste escrito, bem como
nos trabalhos citados, podemos vislumbrar o vasto espectro de possibilidades nas
quais a TCC pode contribuir para a reflexão da forma como os conceitos são
construídos pelos indivíduos, como também no planejamento de atividades que
sejam potencialmente significativas para o ensino de conceitos científicos. Além
das perspectivas tratadas nas pesquisas publicadas e que foram contempladas no
Quadro 1, a TCC também pode ser ampliada em sua potencialidade, já que,
Vergnaud também discute outros aspectos que podem ser utilizados como, o
desenvolvimento de competências (VERGNAUD, 2013), análise da complexidade
de tarefas e procedimentos (VERGNAUD, 1979), estudos sobre as representações
(VERGNAUD, 1979, 1982, 1998, 2007b, 2013a), as formas operatórias e
predicativas do conhecimento (VERGNAUD, 2007a, 2009, 2012, 2013a, 2013b), o
processo de mediação e interação entre os indivíduos (VERGNAUD, 2013a), entre
outros.
Considerando esta proposição, a TCC pode ser utilizada não somente em
conhecimentos científicos, mas também para compreender a construção de
metaconceitos como o apresentado por Vasques et al. (2010), que identificaram
concepções e dificuldades de professores de física no campo conceitual da
modelagem científica.
Além dos conceitos científicos e metaconceitos, o ensino por investigação
também foi considerado por Matos e Martins (2011) como um campo conceitual.
Os autores verificaram, durante formação continuada de uma professora, que
alguns conhecimentos-em-ação foram ampliados, o que, na ótica dos
pesquisadores revelou como frutífera a TCC para a construção e compreensão das
ramificações do campo conceitual de ensino por investigação em professores.
Tauceda (2014) também ponderou sobre a temática da formação de professores
com o uso da TCC, de forma que, com a proposição e resolução de situações-
problemas, os professores em formação continuada e inicial necessitaram
ressignificar alguns conceitos, como os pedagógicos, por exemplo.
Cabe então, por meio do estudo das didáticas, da epistemologia e da
psicologia, compreender a forma como os conhecimentos são desenvolvidos por
meio das situações (PLAISANCE; VERGNAUD, 2003) e também como foram
manifestados no decorrer da história da ciência.
Assim, o presente escrito possibilitou apresentar a Teoria dos Campos
Conceituais, que se mostrou relevante para o entendimento dos processos de
desenvolvimento dos conhecimentos científicos pelos indivíduos, além de se
constituir um bom referencial para o estudo, elaboração e compreensão de
práticas para o ensino de ciências, o que foi evidenciado em nossa revisão
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
bibliográfica. Neste sentido foram vislumbradas as potencialidades da TCC,
especialmente nas aplicações de situações significativas e na compreensão do
processo do desenvolvimento conceitual, mediante análise dos invariantes
operatórios. Embora a TCC revele uma vasta literatura, em especial para conceitos
matemáticos e físicos, sua abordagem ainda é pouco explorada na compreensão
do desenvolvimento dos processos cognitivos sobre outras áreas das ciências.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Theory of Conceptual Fields: visiting its
essential foundations and prospects for
teaching sciences
ABSTRACT
The Theory of Conceptual Fields, developed by French philosopher, mathematician and
psychologist Gérard Vergnaud (1933), is a cognitive theory that refers to the construction
of concepts as its essential foundation. The knowledge of an individual, according to
Vergnaud, is constructed insofar as this person manages to establish relationships and
conceptualize certain situations or problems. Bearing in mind these assumptions, the aim
of this study was to sketch some basics, introduced by Vergnaud, that are based on the
Theory of Conceptual Fields, such as conceptual fields, concepts, situations, schemes,
operative invariants and representations. To this end, his early and current studies were
consulted. More than the assumptions, the Theory of Conceptual Fields has proven relevant
to understanding the development processes of scientific knowledge, in addition to
constructing a good point of reference for the study, elaboration and understanding of
practices for teaching sciences.
KEYWORDS: Learning. Theory of Knowledge. Teaching Sciences. Conceptual Fields.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
REFERÊNCIAS
EYSENCK, M.; KEANE, M. Cognitive Psychology A Student’s Handbook. 4. ed.
New York: Psychology Press Ltd, 2000.
GRENIER, D. La théorie des champs conceptuels et le modèle de conception
(Notes de cours). Grenoble Master2 R et P IC2A Didactique des Sciences. UE TC1
Eléments d'épistémologie et de Didactique. Grenoble. 2007.
KANT, I. Crítica da Razão Pura. Tradução de Manuela Pinto dos Santos e
Alexandre Fradique Morujão. 5. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
MATOS, S. A.; MARTINS, C. M. C. O ensino por investigação como campo
conceitual na teoria de Vergnaud. VIII ENPEC, Campinas, 2011.
PIAGET, J. Biologia e Conhecimento: ensaio sobre as relações entre as regulações
orgânicas e os processos cognoscitivos. Tradução de Francisco M. Guimarães.
Petrópolis: Vozes, 1973.
PLAISANCE, É.; VERGNAUD, G. As Ciências da Educação. Tradução de Nadyr de
Salles Penteado e Odila Aparecida Queiroz. 1. ed. São Paulo: Edições Loyola,
2003.
SANTANA, E. R. D. S. Adição e Subtração: o suporte didático influencia a
aprendizagem do estudante? Ilhéus: Editus, 2012. 235 p.
TAUCEDA, K. C. O contexto escolar e as situações de ensino em ciências:
interações que se estabelecem na aprendizagem entre alunos e professores na
perspectiva da teoria dos campos conceituais. Tese de Doutorado. UFRGS.
Instituto de Ciências Básicas da Saúde. Programa de Pós-Graduação em Educação
em Ciências: Química da Vida e Saúde. Porto Alegre, p. 416. 2014.
VASQUES, B. R.; ARAUJO, I. S.; VEIT, E. A. Concepções e dificuldades dos
professores de Física no campo conceitual da modelagem científica. Revista
Electrónica de Enseñanza de las Ciencias, v. 9, n. 3, p. 669-965, 2010.
VERGNAUD, G. The acquisition of arithmetical concepts. Educational Studies in
Mathematics, v. 10, p. 263-274, 1979.
VERGNAUD, G. Association Cognitive and Developmental Psychology and
Research in Mathematics Education: SomeTheoretical and Methodological Issues.
For the Learning of Mathematics, v. 3, p. 31-41, 1982.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
VERGNAUD, G. Langage et pensée dans l'apprentissage des mathématiques.
Revue française de pédagogie, v. 96, p. 79-86, 1991.
VERGNAUD, G. A Teoria dos Campos Conceituais. In: BRUN, J. Didáctica das
Matemáticas. Lisboa: Instituto Piaget, 1996. Cap. 3, p. 155-191.
VERGNAUD, G. b Algunas ideas fundamentales de Piaget en torno a la didáctica.
Perspectivas, v. XXVI, n. 1, 1996.
VERGNAUD, G. A Comprehensive Theory of Representation for Mathematics
Education. Journal of Mathematical Behavior, v. 17, n. 2, p. 167-181, 1998.
VERGNAUD, G. a ¿En qué sentido la Teoría de los Campos Conceptuales puede
ayudarnos para facilitar aprendizaje significativo? Investigações em Ensino de
Ciências, v. 12, n. 2, p. 285-302, 2007.
VERGNAUD, G. b Représentation et activité : deux concepts étroitement associés.
Recherches en Education, v. 4, 2007.
VERGNAUD, G. The Theory of Conceptual Fields. Human Development, v. 52, p.
83-94, 2009.
VERGNAUD, G. Forme operatoire et forme predicative de la connaissance.
Investigações em Ensino de Ciências , v. 17, n. 2, p. 287-304, 2012.
VERGNAUD, G. a Conceptual Development and Learning. Revista Qurriculum, v.
26, p. 39-59, 2013.
VERGNAUD, G.b Pourquoi la théorie des champs conceptuels? Infancia y
Aprendizaje, v. 36, n. 2, p. 131-161, 2013.
ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Recebido: 31 jan. 2018
Aprovado: 14 abr. 2019
DOI:10.3895/actio.v4n1.7709
Como citar:
CEDRAN, D. P.; KIOURANIS, N. M. M. Teoria dos Campos Conceituais: visitando seus principais
fundamentos e perspectivas para o ensino de ciências. ACTIO, Curitiba, v. 4, n. 1, p. 63-86, jan./abr. 2019.
Disponível em: <https://periodicos.utfpr.edu.br/actio>. Acesso em: XXX
Correspondência:
Débora Piai Cedran
Av. Colombo, 5790, Jd. Universitário - Bloco F67 - Sala 007, Maringá, Paraná, Brasil.
Direito autoral: Este artigo está licenciado sob os termos da Licença Creative Commons-Atribuição 4.0
Internacional.