ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 2, p. 133-153, mai./ago. 2018.
(2010) explica, um licenciando tem bastante contato com aulas antes mesmo de
escolher a profissão docente e antes de lecionar de fato, assim, adquirindo
conceitos, sentidos de como as aulas devem ser, espelhando-se nos seus antigos e
atuais mestres.
O aluno continua: “[...] sou que nem os meus, chegar e dar o conteúdo, sem
ficar (pausa) de (pausa) meios termos, chegar e dar o conteúdo, ficar (extensão da
palavra em procura de complementos, mas sem conclusão). Aí é responsabilidade
da galera. Por exemplo, se tem dúvida, pergunta. Se quer saber mais, corre atrás.
Se não quer nada, fica quieto [...]”. Marte faz duas pausas nessa unidade. Pelo tom
de sua voz e olhar pensativo, ele aparenta ponderar suas palavras, talvez ajuizando
sobre a formação imaginária que ele assumiu para seus ouvintes e, também,
antecipando os sentidos produzidos, pensando pensar que as palavras que usaria
pudessem ser inadequadas ou não concordantes com o que pensam os outros
participantes. Todavia, pelo seu tom de voz, Marte aparenta crer fielmente no que
está afirmando: que não ficaria de “meios termos” em aulas que ministrasse. Ele
defende que, para ensinar Física, basta conhecer o conteúdo, que aula de Física
deve ser baseada em acúmulo e memorização de conteúdos. Juntamente com as
falas que trouxe nessa unidade, Marte demonstra crer que a responsabilidade do
professor é a de, apenas, passar o conteúdo. Pode estar indicando também que, o
professor de Física não tem responsabilidade sobre a aprendizagem dos alunos.
Essa também é a formação discursiva de professores do século passado
(JÚNIOR, 2002) e deste, que possuem uma visão mais tradicional de suas aulas,
enfatizam os conteúdos científicos (TSAI, 2002) e outorgam a maior parte da
responsabilidade do aprendizado aos próprios alunos (CORTELA, 2004, apud
BOZELLI, 2005). Essa ideologia que se arrasta pela história é condenada pelos PCN
(BRASIL, 1999), que investem contra aulas que resumem a aula de Física à
memorização de leis, regras e fórmulas e que não concordam com a realidade dos
alunos (LEMKE, 1990), não atuam em favor da formação para a cidadania e que,
consequentemente, não atraem a atenção dos mesmos (BRASIL, 1999), regredindo
a aula para o nível da memorização para provas (BARROS, 1999).
A formação ideológica, nesse discurso, deslegitima qualquer metodologia de
aula de Física que fuja do tradicionalismo, como, por exemplo, debates, que, para
esse licenciando, são aulas de Física não genuínas. Lemke (1990) alerta sobre estes
tipos de aula que não desenvolvem debates, discussões, escritas, leituras,
experimentos e diversas outras atividades em metodologias nas quais os alunos
podem realmente falar, utilizar e aprender o discurso da Física. Além disso, esses
sentidos de aula de Física não dialogam de maneira positiva com as PCN+ (BRASIL,
2002), pois não apresentam a Física como construção cultural, social, econômica,
histórica e política.
O licenciando em questão termina esse trecho reafirmando: “‘Cê’ passa o que
‘cê’ tem que passar, o que ‘cê’ tem programado ‘pra’ passar e, as outras coisas são
externas”. Essa unidade pode apontar novamente que, para ele, a aula de Física
deve evitar metodologias diferenciadas e inovadoras. Esse discurso é semelhante
ao de professores de Física que possuem poucas horas semanais, por turma, para
lecionarem, necessitando preencher suas aulas com o máximo possível de
conteúdos para poderem cumprir com as exigências relacionadas ao conteúdo
programático. Além disso, esse também é o mesmo discurso de professores que
baseiam suas aulas na necessidade de preparar seus alunos para os vestibulares e