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ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
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A mobilização de saberes a partir do uso de
diferentes materiais didáticos no contexto
do PIBID
RESUMO
Franciellen Rodrigues da Silva
Costa
franciellencostaa@gmail.com
orcid.org/0000-0003-3381-1179
Universidade Estadual de Maringá (UEM),
Maringá, Paraná, Brasil
Sérgio Camargo
s.camargo@ufpr.br
orcid.org/0000-0001-8766-5424
Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Curitiba, Paraná, Brasil
Camila Silveira da Silva
camila@quimica.ufpr.br
orcid.org/0000-0002-6261-1662
Universidade Federal do Paraná (UFPR),
Curitiba, Paraná, Brasil
O presente artigo faz parte de uma dissertação que teve por objetivo investigar quais
possíveis contribuições são percebidas por futuros professores de Química acerca de um
estudo dirigido com diferentes materiais didáticos no âmbito do Programa Institucional de
Bolsa de Iniciação a Docência (PIBID). O desenvolvimento da pesquisa ocorreu em 2014,
onde foram acompanhadas as atividades realizadas pelos bolsistas nas reuniões internas e
atividades nas escolas parceiras ao projeto, os quais utilizaram de diversos materiais com
potencialidades didáticas para o Ensino de Química. A pesquisa caracterizou-se como
qualitativa e sua coleta de dados envolveu a transcrição dos áudios das entrevistas com oito
sujeitos do grupo. Os dados foram analisados com base na Metodologia de Análise de
Conteúdo, possibilitando identificar contribuições no processo formativo dos futuros
professores a partir do uso de diferentes materiais didáticos. Os resultados apontaram para
mobilização de saberes, os quais incluem saber preparar e dirigir atividades na medida em
que o conhecimento da diversidade de recursos e fundamentação teórica corrobora para
inserção dos materiais as práticas de ensino. O outro saber evidenciado na pesquisa trata-
se do saber selecionar os materiais didáticos, onde o professor precisa estar atento aos
critérios e recomendações para inserir os materiais em um planejamento coerente com os
objetivos de ensino.
PALAVRAS-CHAVE: Material Didático. Formação de Professores. Ensino de Química.
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INTRODUÇÃO
As pesquisas a respeito da temática PIBID (Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação à Docência) vêm crescendo constantemente, e no caso dos cursos de
Licenciatura em Química, o quadro não é diferente, há vários trabalhos que
apontam as contribuições do PIBID nos processos formativos de professores
(AMARAL, 2012; BRAIBANTE, WOLLMANN, 2012; PAREDES, 2012; SILVA e
MORTIMER, 2012; SILVA et al., 2012; STANZANI et al.,2012; TOBALDINI, AIRES,
2013; ALBUQUERQUE, GALIAZZI, 2014; RAMOS, 2014), dentre outras. Em virtude
de tais contribuições aferidas na literatura, o programa mostra-se um espaço
amplo para a investigação de diversas temáticas dentro da área de formação de
professor.
O PIBID foi instituído pela Portaria Normativa 38, de 12 de dezembro de
2007, publicada no Diário Oficial da União (DOU) com intuito de fomentar a
iniciação à docência de estudantes de instituições federais de educação superior e
preparar a formação de docentes em nível superior, nos cursos presenciais de
Licenciatura, para atuar na Educação Básica pública (BRASIL, 2007). A ampliação
do programa para as Instituições Estaduais de Ensino Superior pelo edital da CAPES
de 2009 (CAPES/DEB 02/2009 PIBID) por meio da Portaria 122, de 16 de
setembro de 2009, decorre conjuntamente com acréscimo de outros objetivos,
entre os quais aponta de necessidade de proporcionar aos futuros professores
diversas experiências de caráter inovador e interdisciplinar, na busca de superar
problemas identificados no ensino e aprendizagem por meio dos diferentes
processos avaliativos realizados com alunos da Educação Básica.
Apresentam-se aqui resultados oriundos de pesquisa de mestrado, realizada
durante o ano de 2014, na qual foi investigada, durante o desenvolvimento de um
processo formativo, que contribuições foram percebidas por futuros professores
de Química sobre a inserção de estratégias de ensino com diferentes materiais
didáticos no âmbito do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência
(PIBID).
Neste artigo nos dedicaremos a relatar a mobilização de saberes pertinentes
para a inserção e elaboração de atividades que contemplasse o uso de
instrumentos com potencialidade para Ensino de Química. Para isso serão
apresentadas as categorias referentes: ao saber preparar e dirigir as atividades e o
saber selecionar os materiais didáticos. Entendendo que tais saberes estão mais
próximos de um saber fazer no qual implica em uma atitude prática do professor
para a inserção destes materiais em suas práticas (BORGES, 2000; CARVALHO; GIL-
PÉREZ, 2011).
O material didático é utilizado nas diferentes áreas do conhecimento e
apresenta em suas terminologias os significados construídos ao longo dos anos.
Neste caso, a complexidade em falar de material didático está também na
polissemia dos termos utilizados para se referir aos recursos de ensino. Assim,
devido à grande variedade de significados atribuídos ao conceito de material
didático, apresentamos a seguir revisão da literatura sobre material didático e a
nomenclatura que optamos por utilizar nesta pesquisa.
O CONCEITO DE MATERIAL DIDÁTICO
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O campo de conhecimento da Didática é o principal responsável pela
disseminação do termo, significados e atribuições dos objetos de ensino, por
conceber o material como um dos componentes relevantes para o planejamento
didático do professor. A didática compreende-se “ao conjunto de técnicas, através
das quais se realiza o ensino, pelo que se reúne e coordena, em sentido prático,
todos os resultados das ciências pedagógicas, a fim de tornar este ensino mais
eficiente” (NÉRICI, 1971, p.10).
A didática está “relacionada ao como ensinar, orientada por elementos que
vão desde a postura do docente até os meios empregados para promover o ensino
e garantir a aprendizagem” (FREITAS, 2007, p.13). Neste percurso envolve também
as estratégias de ensino responsáveis por organizar o saber didático utilizando-se
de materiais didáticos que possibilitem alcançar os objetivos de ensino.
A diversidade dos termos pode ser verificada pelas diferentes nomenclaturas
apresentadas na literatura da didática, tais como: meios auxiliares, material
didático e recurso de ensino (MATTOS, 1971); material didático (NÉRICI, 1971);
recursos de ensino (TURRA et al.,1975; KARLING, 1991); meios de ensino (LIBÂNEO,
1994); recurso didático (ZABALA, 1998); entre outras.
Na sua obra intitulada Sumário de Didática Geral, o autor Mattos (1971),
usava os termos meio auxiliar e material didático para indicar os elementos básicos
utilizados como instrumentos de trabalho do professor e do aluno, a fim de
“ilustrar, demonstrar, concretizar, aplicar e registrar os fatos estudados” (MATTOS,
1971, p.116), sendo estes meios materiais os recursos para conduzir a
aprendizagem dos alunos.
Na visão de Nérici (1971) a seleção do termo material didático compreendia a
ligação do abstrato ao mundo real, o de forma a substituir a realidade, mas
maneira de representar algo da melhor forma possível, com intenção de facilitar a
compreensão do aluno. Com isso, o processo de ensino e aprendizagem se tornaria
mais eficaz pela inserção da realidade por meio de experiências diretas e o
emprego de recurso de ensino, na medida em que “pode proporcionar aos alunos
experiências para desenvolver a compreensão e a reflexão” (TURRA et al.,1975,
p.165).
Libâneo (1994) utiliza o termo, meios de ensino, com o intuito de não limitar
os objetos como única forma de representação do mundo a ser utilizados pelos
professores e alunos na organização e condução do processo de ensino-
aprendizagem, mas também inclui os recursos da localidade como espaços de
aprendizagem, como por exemplo, a biblioteca, o museu, as excursões escolares,
dentre outros.
A polissemia dos termos pode ser visto ainda nas ideias de Karling (1991) e
Turra et al. (1975), ao apontarem o termo recursos de ensino para designar os
meios de auxiliar do professor no processo de ensino e aprendizagem, podendo
ser classificado em recursos materiais e recursos humanos. A esta última tipologia
acrescenta a ideia de recursos os seres humanos responsáveis pelo processo de
ensino-aprendizagem, sendo considerados os próprios professores, profissionais
da educação, alunos e a comunidade que participa do processo educativo.
Na revisão da literatura fica evidente a variedade de termos utilizados para
denominar um meio ou recurso usado pelo professor e aluno em suas atividades
escolares. No entanto, deve-se haver o cuidado para não serem tratadas como
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sinônimos, uma vez que suas especificidades estão relacionadas aos significados
construídos por diferentes autores e contextos. Usar as palavras recursos e meios
são formas mais amplas no sentido de colocar neste processo de ensino e
aprendizagem não somente objetos, mas os diferentes profissionais envolvidos na
educação formal, e nos espaços não formais de Educação.
O material didático compreendido em sua materialidade consiste em qualquer
objeto que possa ser inserido no ensino com objetivo de instrumentalizar o ensino,
e facilitar o processo de ensino-aprendizagem. Logo são muitos os objetos a serem
considerados materiais didáticos, desde que adquiram “um conjunto de
significados criados pelas práticas humanas e [...] sejam inerentes às práticas
educativas” (FISCARELLI, 2008, p. 125).
Compreendendo os materiais como objetos concretos, Zabala (1998) define
os como “todos aqueles instrumentos que proporcionam ao educador referências
e critérios para tomar decisões, tanto no planejamento como na intervenção direta
no processo de ensino-aprendizagem”. Mas o autor esclarece a existência de
diferentes tipos de materiais didáticos conforme o âmbito de intervenção, a
intencionalidade ou função, os conteúdos e a maneira de organizá-los.
Diante dessas várias terminologias optamos em utilizar o termo material
didático por compreender que os objetos utilizados durante o processo formativo
no contexto do PIBID estão mais próximos das definições de Fiscarelli (2008), em
virtude de sua materialidade e das condições que levaram à construção de
significados pela ação dos futuros professores no processo de ensino e
aprendizagem.
A RESPEITO DA UTILIZAÇÃO DO MATERIAL DIDÁTICO NA PRÁTICA DOCENTE
Os autores do campo da Didática apontam o material didático como um
instrumento essencial para mediar o processo de ensino-aprendizagem. Mas é
preciso tomar cuidado ao assumir o material didático como um mero auxiliar do
professor, para Borges (2000, p.183), ele “é muito mais do que isso: é elemento de
interferência no processo ensino-aprendizagem, em níveis distintos, mas
significativos”. Assim, é necessário romper com este olhar reducionista a respeito
do material torna-se necessário repensar com quais objetivos estes m sido
inseridos nas práticas dos professores.
De acordo com Nérici (1971) e Borges (2000) os materiais didáticos devem ser
usados nas práticas escolares a fim de: aproximar a realidade dos alunos e do
conhecimento, facilitando a percepção e compreensão de conceitos, ou ainda
ilustrar os fatos; motivar os alunos no processo de ensino-aprendizagem;
concretizar momentos oportunos para a manifestação de aptidões e
desenvolvimento de habilidades específicas e a construção e elaboração dos
mesmos por parte dos alunos.
Apesar de tais objetivos a simples inserção dos materiais didáticos não
significa a melhoria dos processos de ensino, se os professores não tomarem
conhecimentos dos critérios e das recomendações quanto ao seu uso. A
valorização do material não pode permitir a passividade do aluno em sala de aula,
e os professores como mediadores no processo de ensino e aprendizagem devem
estar atentos às recomendações e cuidados relacionados ao uso do material.
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Entre esses critérios, os professores deveriam estar atentos a algumas
recomendações trazidas nos manuais da didática, tais como: os cuidados para
seleção dos materiais didáticos, a adequação dos objetivos de ensino, a
disponibilidade e cuidados que envolvam o exame prévio dos recursos, e até
mesmos as formas mais efetivas para sua utilização (TURRA et al., 1975).
Para Karling (1991) os materiais devem ser usados como forma de facilitar e
intensificar a aprendizagem e não para poupar esforços e simplificar o trabalho
docente. No entendimento do autor, o professor precisa atentar-se a análise dos
objetivos propostos e os benefícios pela sua inserção, além de verificar se conhece
e sabe como utilizá-lo em sala, bem como testá-los antes de inserir nos
planejamentos e certificar-se das condições para uso, a fim de evitar surpresas,
imprevistos e constrangimentos (KARLING, 1991).
critérios reforçados por Freitas (2007) que condizem com a adequação aos
objetivos e conteúdos. Afirma que por melhor que seja o recurso não podemos
utilizar os materiais apenas como forma de enfeites em sala de aula. A tarefa de
levar os instrumentos para a sala de aula consiste em considerar o grau de
desenvolvimento cognitivo, afetivo e psicomotor dos alunos. Além disso, os
materiais precisam ser simples, como baixo custo e despertar o interesse e
curiosidade dos alunos (FREITAS, 2007).
Segundo Zabala (1998) uma série de critérios e recomendações a serem
observadas na análise dos materiais curriculares. Para a seleção dos recursos
didáticos, o primeiro passo é detectar os objetivos educacionais e verificar se os
mesmos estão de acordo com as intenções educacionais; o intuito é o de identificar
carências e até mesmos rejeitar os aspectos contraditórios. O segundo relaciona-
se aos conteúdos, de forma a averiguar a correspondência entre objetivos de
ensino. E, por fim, considerar a adaptação deste material, acrescentando ou
elaborando materiais complementares para suprir as lacunas existentes.
Entretanto o que os professores reconhecem como material didático? Na
pesquisa de Fiscarelli (2008), que buscou identificar no discurso dos docentes suas
concepções em torno desta temática, os mesmos consideram como material
didático vários objetos, desde os mais tradicionais como quadro negro e livro
didático, até os mais inovadores como computadores, vídeo, jornal, música, jogos,
revistas, livros paradidáticos, ente outros.
As constantes mudanças no processo de ensino-aprendizagem no cenário
atual influenciam a construção de significados atribuídos ao papel dos materiais
inseridos nas práticas docentes. Entre os significados e valores constituídos,
Fiscarelli (2008) indica que os mesmos são tidos como modernizadores da prática,
uma vez que possibilita a renovação da prática a partir de novas alternativas
didáticas.
O que vemos são os termos inovador e moderno aparecerem com a missão de
renovação do ensino. Contudo é preciso tomar cuidado com estas afirmações, o
fato de acrescentar um recurso inovador não significa renovação, pois as práticas
dos professores podem ainda estar baseadas em formas tradicionais de ensino.
As metodologias permanecem frente à ingenuidade dos professores em
reconhecer a necessidade de mudanças em suas práticas pedagógicas, e até
mesmo justificar as dificuldades atribuídas ao aprendizado dos alunos somente aos
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“problemas de aprendizagem, mas não de ensino” (SCHNETLZER, 2010, p. 150) e
menos ainda ao seu processo formativo.
A própria academia tem enfrentado obstáculos na formação dos profissionais
de educação devido às lacunas existentes nos cursos de Licenciaturas. Entre elas
está o “fosso que separa a formação pedagógica da formação específica no campo
de conhecimento em que vai estudar” (MALDANER, 2003, p.45), ocasionando a
ausência de articulação entre as duas áreas responsáveis em formar os professores
(MALDANER 2003; BENITE et al., 2010; SCHNETZLER, 2010).
uma própria dicotomia das responsabilidades dos professores nos cursos
de Licenciaturas. Enquanto os docentes da área pedagógica estão compromissados
na formação de professores, os docentes das áreas específicas se dedicam a formar
pesquisadores em suas áreas específicas (SILVA, OLIVEIRA, 2009). É imprescindível
a partilha entre as áreas específicas e pedagógicas como responsáveis pela
formação dos professores nos cursos de Licenciaturas. Os formadores nos cursos
de Licenciaturas se esquecem de que “saber os conteúdos de Química, por
exemplo, em um contexto de Química”, é diferente “de sabê-los, em um contexto
de mediação pedagógica dentro do conhecimento químico” (MALDANER, 2003,
p.45).
A falta de preparação dos futuros professores para atuar na Educação Básica,
os impulsiona a buscar respostas imediatas em sua formação ambiental, aquelas
que foram usadas em sua educação escolar (MALDANER, 2003; SCHNETZLER,
2010). Desta forma, acabam por buscar e aplicar as mesmas metodologias que os
seus professores utilizaram em sua formação educacional. E isso acarreta em um
círculo vicioso que mantém os “professores mal formados ministrando um ensino
tradicional para alunos do Ensino Médio que detestarão Química” (SCHNETZLER,
2010, p.158).
Em meio a estas preocupações, políticas públicas têm promovido por meio de
ações do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), um
currículo de licenciatura que contribua para reflexão destes futuros professores
sobre sua prática docente, bem como oportunizar a troca de experiências pelo
trabalho colaborativo, a elaboração de propostas didáticas inovadoras, dentre
outras.
Entre os objetivos do PIBID que visa à formação de professores da Educação
Básica e a valorização do magistério, está o incentivo de proporcionar aos
licenciandos experiências de caráter inovador e interdisciplinar, com intuito de
superar o ensino fragmentado e descontextualizado tão frequente nas disciplinas,
principalmente no ensino de Ciências, responsáveis pelas concepções atribuídas
pelos alunos de uma disciplina abstrata e de difícil compressão.
Há a necessidade de inovação para a renovação da prática dos professores. E
os formadores dos cursos de licenciatura precisam responsabilizar-se no sentido
de apresentar novas alternativas didáticas para que os futuros docentes “possam
aprendê-las, imitá-las e, futuramente, adotá-las e transformá-las na sua prática
docente” (SCHNETZLER, 2010, p.160).
O professor deve estar atento às mudanças escolares e compreender a
necessidade das modificações nas formas de aprender e ensinar condicionadas
pelo momento em que se vive. Os materiais didáticos antes enfatizados em sala de
aula como o livro didático, não dão conta da motivação para aprender. Os
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estudantes têm o acesso a informações antes mesmo de chegar às escolas, e o
papel de mediar esta informação para construção de conhecimento requer do
professor o planejamento didático e organização para escolha de novos materiais
didáticos capazes de conceder o ensino e aprendizagem.
AS NECESSIDADES FORMATIVAS PARA USO DOS MATERIAIS DIDÁTICOS
Ao colocar o material didático como recurso importante para renovação da
prática do professor é preciso considerar quais são os saberes necessários para o
professor conseguir selecionar, preparar, utilizar e planejar suas atividades a cerca
destes recursos.
Neste caso, as necessidades formativas apontadas por Carvalho e Gil-Pérez
(2001) são importantes para o entendimento de como estes saberes são
necessários para uso de diferentes materiais didático no Ensino de
Ciências/Química. As ideias destes autores enfatizam que as necessidades
formativas estão distribuídas entre: conhecer a matéria a ser ensinada; conhecer
e questionar as ideias docentes de “senso comum” sobre o ensino e aprendizagem
das ciências; adquirir conhecimentos teóricos sobre a aprendizagem das Ciências;
saber analisar criticamente o ensino fundamental; saber preparar as atividades
capazes de gerar uma aprendizagem efetiva; saber dirigir as atividades dos alunos;
saber avaliar e saber utilizar a pesquisa e inovação. Estes saberes estariam
distribuídos entre o saber e o saber fazer.
No caso das necessidades formativas apresentadas é necessário entender
como estes saberes estão relacionados com os materiais didáticos. A utilização de
qualquer material didático tem como requisito o domínio da área de
conhecimento a ser ensinada. Este domínio não está somente na apropriação dos
conceitos, mas as relações possíveis com CTSA (Ciência, Tecnologia, Sociedade e
Ambiente), os problemas envolvidos na construção dos conhecimentos, as
dificuldades e obstáculos epistemológicos para a aprendizagem dos alunos, a
seleção de conteúdos adequados para apresentar uma visão correta de Ciência e
estar preparado para aprofundar-se naquilo que está sendo trabalho para adquirir
novos conhecimentos (CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011). A partir dos preceitos
apontados o professor terá mais segurança para selecionar um material que o
auxilie nos objetivos proposto para sua atividade em sala de aula. Apenas dominar
os conceitos da disciplina irá comprometer a seleção do material, visto que o
objetivo do mesmo será somente a transmissão de conteúdos.
Outra necessidade formativa consiste em saber questionar as ideias docentes
de “senso comumsobre o ensino e aprendizagem das ciências. Este saber está
relacionado com a necessidade do professor “em conhecer e questionar o
pensamento docente espontâneo” (CARVALHO, GIL-PÉREZ, 2011, p.27). Alguns
professores não compreendem que suas ideias, atitudes e comportamento são
remanescentes da formação ambiental durante o ensino escolar. Esta formação o
aprisiona em ideias de senso comum e não permitem a reflexão de suas ações, por
achar que tudo está óbvio. Ao adicionar outros materiais didáticos em suas
propostas práticas, o professor pode reconhecer estes pensamentos de senso
comum, visto que os mesmos estavam bloqueando uma renovação da prática. Os
esforços para a inovação do ensino devem levar os professores a repensar se suas
metodologias de ensino questionam a visão simplista de Ciências e do trabalho
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científico e a redução a certos conhecimentos específicos esquecendo os aspectos
históricos e sociais importantes na construção da Ciência (Carvalho, Gil-Pérez,
2011, p.27). Dentro desta perspectiva, o professor precisa superar suas visões
simplistas e de senso comum no que se refere às suas estratégias de ensino, e não
acomodar-se no sentido de utilizar sempre o livro didático com único material
didático.
A mudança desta visão concede ao professor possibilidades de mudanças de
suas concepções prévias do que é ensinar e aprender, ao promover a busca de
novos caminhos em suas práticas, no intuito de buscar a aprendizagem dos alunos
que precisam estar motivados a aprender.
Ao tratar de aprendizagem, chega-se à terceira necessidade formativa
apresentada por Carvalho e Gil-Pérez (2011), na qual aponta a relevância dos
profissionais da educação em conhecer as teorias da Ciência da Educação. Esta
fundamentação serve como subsídio para elaboração de argumentos, críticas
coerentes e direcionamentos em suas ações. As teorias de aprendizagem auxiliam
os professores a reconhecer que a seleção dos materiais didáticos depende de um
olhar para os alunos que irão utilizar tal material. Identificar o aluno como parte
importante para o ensino-aprendizagem é assumir a teoria como fonte de
melhorias no trabalho docente, na organização do processo de ensino-
aprendizagem, e assim “dominar alternativas metodológicas que possibilitem
diversificar as formas de ensinar” (BORGES, 2000, p. 63).
Esta necessidade está diretamente associada ao saber analisar criticamente o
ensino tradicional, o qual mostra um costume expresso no discurso dos
professores em rejeitar o “ensino tradicional”, porém apesar dessas repulsas,
nota-se a exisncia de práticas com as mesmas características de 60 anos atrás. A
situação reflete o peso de uma “formação ambiental” não submetida a uma
“crítica explícita, constituindo-se, em algo natural sem chegar a ser questionada
efetivamente” (CARVALHO, GIL-PÉREZ, 2011, p.39). Assim, apesar do professor
mostrar uma rejeição ao ensino tradicional, muitas vezes isso ocorre
verbalmente, pois na ausência de alternativas, os professores recorrem a esta
formação ambiental.
De fato, essas mudanças didáticas exigem mais do que afirmar as dificuldades
encontradas por professores, e sim oferecer alternativas viáveis para detectar
insuficiências nas limitações habituais envolvidas com os currículos enciclopédicos,
a introdução de conhecimento, os trabalhos práticos, os problemas propostos, as
avaliações e as formas de organização escolar (CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011).
Portanto, as necessidades formativas até aqui apresentadas estão
relacionadas aos saberes que devem ser de domínio conceitual do próprio
professor. Pois segundo Borges (2000), o uso do material didático necessita estar
de acordo um objetivo educacional, e isso carece de intensa reflexão, no sentido
de que a inserção do material não tenha um fim em si mesmo. Mas além do saber,
é preciso saber fazer, e entende-se que este saber está associado ao uso de
materiais didáticos, na qual consiste em saber preparar as atividades capazes de
gerar uma aprendizagem efetiva e saber dirigir as atividades dos alunos (BORGES,
2000).
Para Borges este saber fazer está dentro de uma dimensão relacional
manifestada na prática pedagógica, na qual requer do professor uma atitude
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prática na busca de saber preparar as atividades capazes de gerar uma
aprendizagem efetiva e isso inclui: saber selecionar conteúdos frente os objetivos
educacionais para uso do material didático, considerando os fatores internos e
externos da sala de aula; selecionar ou produzir os materiais respeitando o nível
cognitivo do aluno; utilizar materiais que promovam a participação ativa e
construção do conhecimento; buscar formas de envolver questões
interdisciplinares no uso destes materiais, identificar as dificuldades dos
problemas de aprendizagem e superá-los pelo uso de diferentes materiais
didáticos (BORGES, 2000).
Além de saber dirigir as atividades, uma vez que envolve a apresentação
adequada das atividades a ser realizadas para compreensão do todo e busca de
interesse pelo aluno. E com isso, saber ordenar as atividades para que o uso dos
materiais didáticos não adquira a função de adereço. Criar um ambiente favorável
na construção do conhecimento, do diálogo entre professor e aluno, de forma a
facilitar a apreciação e aprendizagem por parte dos alunos. Neste momento o
professor retira-se do papel de simples transmissor para tornar-se
orientador/pesquisador em sala de aula (CARVALHO, GIL-PÉREZ, 2011).
Por fim está o saber avaliar, um aspecto necessário para mudança didática, no
sentido de os professores reconsiderarem como suas formas de avaliações não
estão sendo coerentes com as propostas didáticas realizadas em sala de aula. Esta
coerência consiste em “utilizar a avaliação como instrumentos de aprendizagem
que permita fornecer um feedback adequado para promover o avanço dos alunos”
(CARVALHO, GIL-PÉREZ, 2011, p.60). Na medida em que novos materiais didáticos
são inseridos os professores deverão refletir sobre as formas de avaliar as
aprendizagens dos alunos. No momento em que os livros didáticos o
complementados com outros recursos a fim de chegar a um objetivo educacional,
torna-se relevante a mudança das formas de avaliar aquele processo de ensino-
aprendizagem. O instrumento servirá como diagnóstico para averiguar se a
proposta elaborada condiz com os objetivos propostos.
O CONTEXTO DO DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA
A pesquisa aqui apresentada caracteriza-se como qualitativa conforme os
aspectos apontados por Bogdan e Biklen (1994), ao utilizar um ambiente natural,
como o contexto do subprojeto PIBID para investigação, bem como o predomínio
de situações descritivas para melhor compreensão dos fatos, a partir das
atividades realizadas.
O desenvolvimento das atividades ocorreu durante o ano de 2014 no âmbito
de um Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (PIBID) de
subprojeto de Química em uma Instituição Federal de Ensino Superior, com a
participação de 14 bolsistas. Ao longo do período de investigação foram
acompanhadas 7 atividades desenvolvidas para o estudo de diferentes materiais
com potencialidades didáticas. Tendo, entre estes materiais a letra de música, o
poema, o livro de literatura com divulgação científica, histórias em quadrinhos,
trechos de filmes, jogos e jornais.
As atividades foram desenvolvidas da seguinte maneira: 1) a seleção dos
referenciais pela coordenadora do subprojeto; 2) a divisão de trabalho por grupos
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de interesse; 3) a explicação da proposta a ser realizada; 4) a elaboração de
estratégias para apresentações e direcionamentos das discussões nas reuniões
internas; 5) o desenvolvimento de atividades teórico-prática a ser realizada entre
os participantes do programa; 6) o fechamento das discussões sobre as
potencialidades dos materiais didáticos ao serem inseridos no Ensino de Química.
Entre as abordagens realizadas e acompanhadas pela pesquisadora está à
utilização do Livro Tio Tungstênio, nos quais cada licenciado responsável por um
capítulo deveria fazer a leitura do material e apresentar verbalmente de maneira
sucinta a ideia geral dos conteúdos químicos existentes, para em seguida propor
uma proposta didática por meio deste material.
Nas duas reuniões seguintes as atividades dedicaram-se ao estudo das
histórias em quadrinhos, sendo que no primeiro encontro os participantes foram
divididos em duplas para leitura de dois referenciais teóricos: ‘Como usar as
histórias em quadrinhos na sala de aula’ e ‘Quadrinhos na Educação’. Os grupos
organizam as discussões em PowerPoint para dinamizar os pontos mais
importantes apresentados na Literatura. O segundo dedicou-se a apresentação de
tutorias dos softwares destinados à elaboração de quadrinhos para ensino de
Ciências, entre eles o Comic Life, o Pixton, o Toondoo
e a Hagáqué.
Outra proposta baseou-se no estudo do jogo, pelos referenciais intitulados
Jogos e Atividades Lúdicas no Ensino de Química: Teoria, Métodos e Aplicações,
Jogos no Ensino de Química: Avaliação da produção científica a partir dos trabalhos
publicados nos Encontro Nacionais de Química (Período 1996-2008) e Jogos no
Ensino de Química: Considerações teóricas para sua utilização em sala de aula. A
atividade também se distribui em dois encontros, onde o primeiro limitou-se a
discussões dos pontos relevantes para inserção do jogo no ensino, e finalizou-se
pela distribuição de alguns jogos confeccionados ao grupo. O objetivo era a seleção
de um jogo por uma dupla de bolsistas, os quais deveriam propor regras, identificar
os conceitos químicos envolvidos, indicar um público alvo, propor uma forma de
avaliação, levantar críticas e sugerir adaptações ao jogo.
Em outro momento usou o jornal como recurso de ensino, e partiu da leitura
do capítulo “Por que o Jornal na escola? da obra Como usar o jornal em sala de
aula, e do artigo O uso do jornal impresso na educação básica: resultado de uma
década de pesquisa no Brasil. Em um primeiro momento, todos sentaram em
círculos para dar início às discussões sobre o tema proposto e indicar as
potencialidades do material para o ensino. Como parte da proposta os bolsistas
deveriam selecionar uma reportagem de jornal a ser inserido no Ensino de Química
e propor para os colegas uma estratégia de ensino.
Em um último momento, dedicaram-se ao estudo do vídeo como material
didático, e os textos de base para tais discussões pautaram-se nos capítulos do
livro intitulado Como usar o cinema em sala de aula, com objetivo de verificar os
cuidados para inserção dos mesmos em sala de aula. A atividade estendeu-se para
outra reunião, com intuito de propor aos bolsistas a apresentação de trechos dos
filmes - Perfume: a história de um assassino e O milagre de Anne Sullivan como
exemplo de recursos a serem inseridos nas aulas de Química.
Nessa primeira fase da pesquisa a coleta de dados utilizou-se da observação
registrada em um diário de campo, de forma a registrar as datas das reuniões, os
participantes presentes nas atividades, as estratégias utilizadas para estudo e
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
apontamentos importantes ao pesquisador. Em conjunto usaram-se as gravações
de áudio e imagens para descrever as atividades minunciosamente.
Na segunda fase da investigação, realizou-se uma pesquisa documental, por
meio dos relatórios semestrais entregues pelos bolsistas à coordenadora do
subprojeto de PIBID/Química. Por meio das reflexões dos bolsistas nas atividades
descritas nos relatórios, a análise buscou identificar a existência de ações
desenvolvidas com os materiais didáticos apresentados ao longo das reuniões
internas no período de 2014 nas escolas parceiras ao subprojeto.
A partir dos critérios apresentados foram escolhidos 8 sujeitos para uma
entrevista semiestruturada guiada por um conjunto de perguntas realizadas ao
final do processo formativo, com objetivo de reunir informações sobre as
concepções dos bolsistas a propósito da vivência desse processo formativo no
âmbito do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID).
PROCEDIMENTO METODOLÓGICO PARA ANÁLISE DAS ATIVIDADES
DESENVOLVIDAS NO PROCESSO FORMATIVO
Utilizamos como procedimento para a interpretação dos dados coletados
nesta pesquisa a Análise de Conteúdo conforme proposta por Bardin (2011). Essa
metodologia de análise se configura em três fases: a pré-análise, exploração do
material e tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação.
A pré-análise, consistiu na organização de um esquema de trabalho com
métodos bem determinados, ainda que versátil. Foram realizadas anotações em
diário de campo e registros em áudio e vídeo das atividades desenvolvidas para o
estudo dos diversos materiais com potencialidades didáticas em diferentes
momentos do processo educativo. A elaboração do material para análise teve
início com a organização das entrevistas transcritas, a leitura dos artigos utilizados
nas sequencias didáticas, das questões anotadas no diário. Após a transcrição dos
dados das entrevistas, teve início a leitura flutuante.
Na fase seguinte, exploração do material e tratamento dos resultados, foram
escolhidas as unidades de codificação, utilizando-se a letra L (Licenciando) seguida
do índice numérico de 1 a 8 e teve como objetivo manter o anonimato dos sujeitos
e orientar ao pesquisador para a análise dos dados. Em seguida, os dados foram
submetidos ao processo de unitarização, que consistiu em uma leitura minuciosa
para gerar as unidades de significados.
Após esta etapa, realizaram-se os agrupamentos das unidades de significados
em categorias a priori. A elaboração da primeira categoria intitulada saber
selecionar os materiais didáticos fundamenta-se nas ideias de pesquisadores
como Fiscarelli (2008), karling (1991), Turra et al., (1975), que afirmam serem
necessários alguns cuidados por parte dos professores para a seleção de materiais
didáticos, a fim de não utilizar o material como um fim em si mesmo. Entre os quais
está presente a análise prévia do material, o conhecimento de referências para sua
otimização e integração dos conteúdos disciplinares (FISCARRELI, 2008), a
adequação dos objetivos educacionais (TURRA et al., 1975) o conhecimento dos
benefícios para sua inserção e as especificidade de cada material (KARLING, 1991),
dentre outras.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
A segunda categoria a priori refere-se a um saber preparar e dirigir atividades,
sendo elaborada pela fundamentação teórica de Carvalho e Gil-Pérez (2011) e
Borges (2000). Nas ideias de Carvalho e Gil-Pérez (2011) existem necessidades
formativas para um saber e saber fazer no Ensino de Ciências, e isto inclui a
utilização de materiais didáticos. Sendo que segundo Borges (2000) a inserção dos
mesmos na prática do professor está mais próxima de um saber fazer baseados
nas necessidades formativas.
A construção das categorias descritas acima pode ser observada no Quadro 1.
Quadro 1 Os caminhos percorridos para construção das categorias de análise.
Categorias iniciais
Conceito norteador
Categorias finais
1. Selecionar os
materiais a partir de
cuidados necessários
Indica as preocupações para a
seleção de materiais em suas
práticas, a fim de não utilizar o
material com um fim em si mesmo.
Saber selecionar os
materiais didáticos
2. Selecionar os
materiais didáticos:
Público Alvo
Enfatiza que a seleção dos materiais
deve levar em conta o público alvo
que será atingido, como a turma,
faixa etária, características dos
indivíduos.
3. Selecionar os
materiais didáticos:
conteúdo/objetivo
de ensino
Reconhece os critérios de seleção
dos materiais a partir dos objetivos
de ensino que pretende ensinar aos
alunos.
4. Selecionar os
materiais didáticos:
disponibilidade e
acessibilidade
Explicitar que a seleção deve levar
em conta o acesso dos sujeitos
envolvidos a estes materiais
didáticos.
5. Saber elaborar
atividades
Possibilita ao professor saber
elaborar práticas de ensino que
comtemplem o uso de diferentes
materiais didáticos.
Saber preparar e
dirigir as atividades
com os materiais
didáticos
6. Saber articular os
materiais didáticos
em uma mesma
atividade
Proporciona a habilidade em
articular mais de um material
didático dentro de uma mesma
atividade em sala de aula.
Fonte: Autoria própria (2016).
A última etapa da pesquisa compreendeu-se na inferência e interpretação dos
dados, sendo segundo Moraes (1999) e Bardin (2011) o primeiro momento de
comunicação com o objetivo de elaborar um texto síntese para expressar um
conjunto de significados presentes nas duas categorias elaboradas a priori. Para
isso, utilizamos as citações diretas das falas dos sujeitos de pesquisa obtidas
durante a entrevista, buscando aferir relações com a fundamentação teórica para
extrapolação dos significados atribuídos pelos futuros professores participantes
sobre as atividades didáticas desenvolvidas nesse processo.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
RESULTADO E DISCUSSÃO
A partir da organização dos resultados procuramos torná-los significativos e
válidos. A ideia é que a interpretação vá além dos conteúdos manifestos nos
documentos que analisamos, pois, interessa-nos o conteúdo oculto, o sentido que
se encontra por trás do imediatamente realizado e apreendido. Assim,
considerando o conjunto das atividades realizadas e das 8 entrevistas analisadas,
descrevemos os resultados, destacando as falas dos sujeitos de pesquisa. Ao
mesmo tempo, apresentamos nossas reflexões para cada uma das categorias
criadas, referentes aos saberes mobilizado pelos futuros professores que
participaram do processo formativo.
SABER SELECIONAR OS MATERIAIS DIDÁTICOS
A primeira categoria retratou um saber fazer relacionado a uma postura crítica
do professor, onde se devem incluir cuidados necessários para seleção de
materiais didáticos, entre os quais se destaca a análise prévia do material, a
integração do material ao conteúdo, o respeito pelo público alvo a ser atingido e a
acessibilidade e disponibilidade. Alguns dos indicadores podem ser observados no
Quadro 2, onde apresentamos as unidades de significado.
Quadro 2 - Indicadores sobre saber selecionar os materiais didáticos
Categorias
finais
Categorias
iniciais
Unidades de significado
Saber
selecionar os
materiais
didáticos
Selecionar os
materiais a
partir de
cuidados
necessários
[...] conhecer o recurso, estudar suas
potencialidades e pensar em como utilizar e qual
a forma de organizar os conteúdos a serem
trabalhados, bem como conhecer a turma [...]
(L2).
[...] linguagem e palavras descritas, no sentido de
estar atento aos termos pejorativos, conteúdos
pornográficos, discriminação de raças e religiões
(L3).
No caso jogo [...] é preciso tes-los e verificar
suas regras [...] (L1)
Selecionar os
materiais
didáticos:
Público Alvo
[...] verificar as linguagens técnicas, os termos
usados para os diferentes níveis de ensino, as
características do material para cognição
daquele aluno (L5).
Selecionar os
materiais
didáticos:
conteúdo/obj
etivo de
ensino
[...] verificar os objetivos de ensinar determinado
conteúdo por meio deste recurso (L6).
[...] a pior besteira é achar que não precisa do
domínio do conteúdo para usar o material
didático (L2).
Selecionar os
materiais
didáticos:
disponibilidad
e e
acessibilidade
[...] uma pesquisa intensa de qual material
encontra-se acessível na biblioteca [...] e fazer
um levantamento do material disponível para o
preparo da aula (L2).
Fonte: Autoria própria (2017)
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
Nas percepções dos bolsistas houve contribuições para formação de uma
postura criteriosa, no sentido de tomar cuidado e preocupar-se ao selecionar o
material didático a fim de não utilizar o material como um fim em si mesmo. Entre
estes cuidados necessários L2 afirma ser preciso conhecer o recurso, estudar suas
potencialidades, pensar em como utilizar e qual a forma de organizar os conteúdos
a serem trabalhados’. Este processo leva em conta o planejamento muito bem
estruturado, além de, ‘conhecer a turma que irá trabalhar os limites para uso do
material, precisa conhecer o contexto da escola, o turno, número de alunos, entre
outras coisas” (L2).
Os resultados corroboram os critérios apontados por Karling (1991), onde o
autor afirma que a inserção do material exige do professor o conhecimento sobre
determinados recursos, bem como suas características, linguagens, potencialidade
e limites. Neste sentido, a inclusão não deve ser vista como forma de poupar
esforços do professor, mas analisar os objetivos propostos e verificar benefícios
envolvidos no seu uso.
Para isso, o planejamento deve estar claro e interligado com os conteúdos e
os objetivos de ensino, pois segundo Freitas (2007) a falta de adequação aos
objetivos e conteúdos pode caracterizar os materiais didáticos apenas como
passatempo. Por isso é tão importante a análise do material antes da incorporação
na prática pedagógica, no sentido de verificar as linguagens técnicas, os termos
usados para os diferentes níveis de ensino, as características do material para
cognição daquele aluno” (L5). Além de averiguar se o material pertence ao
contexto do aluno e certificar se o vocabulário descrito no material condiz com a
faixa etária da turma. No caso dos gêneros textuais, é imprescindível uma leitura
minuciosa com o objetivo de verificar a ortografia como a existência de erros
gramaticais ou conceituais. Outra recomendação é sobre as preocupações com
valores e ética, pois segundo L3 deve-se tomar cuidado com a [...] linguagem e
palavras descritas, no sentido de estarem atentos aos termos pejorativos,
conteúdos pornográficos, discriminação de raças e religiões (L3).
A seleção de alguns materiais, como o jornal, depende de uma maior
criticidade do professor, no sentido de estar atento à veracidade das informações
contidas nas reportagens, uma vez que os jornais são meios midiáticos de grandes
influências políticas, e para L8, os textos em sua maioria são escritos por pessoas
que às vezes não têm formação específica na área do conhecimento para tratar de
determinados assuntos, relacionados aos conteúdos de Ciência” (L8). O uso de
jornais como meio auxiliar no ensino de química não é estranho às práticas
docentes. Sua implementação é casual devido o caráter imediato e atual das
notícias, mas carece de uma exploração atrelada aos objetivos de ensino.
Além disso, é indispensável testar o material antes de levá-lo para sala de aula.
Pois este momento se configura como um momento para praticar e ao mesmo
tempo examinar possíveis falhas e as possibilidades para sua inclusão. Na visão de
L6, o professor precisa conhecer o material, e praticar um pouco (...) a fim de
analisar todos os critérios, e verificar quais os objetivos para ensinar determinado
conteúdo por meio deste recurso (L6). A falta de critérios ocasionará a
simplicidade da atividade por usar os materiais apenas como entretenimento, ou
promoverá obstáculos à aprendizagem.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
Outra precaução necessária para uso do material didático está na condição de
não tornar esta prática inovadora como algo que traga resistência ao aluno. Muitas
vezes, tais materiais são empregados em sala de aula como forma de passatempo
sem mostrar a potencialidade daquele recurso para o ensino. Deste modo, passam
a ser vistos pelos alunos como materiais para o momento de descontração, e isto
implica numa futura resistência por parte dos mesmos, por não acreditarem que
tal material poderá colaborar com o seu aprendizado. Por exemplo, ao levar um
monte de história em quadrinhos com intuito de entretenimento pode propiciar
no futuro uma resistência em utilizar este material para ensino e aprendizagem.
Além disso, o professor deve ter a prudência de não mostrar entusiasmo por
apenas um material, uma vez que somente um recurso não conseguirá atender
todas as propostas didáticas para trabalhar os conteúdos científicos de uma
disciplina.
O saber selecionar os materiais consiste ainda em considerar o público alvo,
levando em conta a turma, a faixa etária e as características do indivíduo, a fim de
que o material não se torne um obstáculo na aprendizagem dos alunos. A
importância de traçar o perfil da turma é conhecer todos os alunos integrantes do
contexto a ser utilizado o material didático. Atualmente, uma enorme
diversidade de alunos na Educação Básica, e entre eles existem alunos com
Necessidades Educacionais Especiais (pessoas com deficiência, transtornos globais
de desenvolvimento ou com altas habilidades/superdotação). Então, inserir o
material didático em sala de aula, significa fazer deste processo um momento
prazeroso para todos, e acima de tudo respeitar as características de cada
indivíduo. A escolha do recurso deve levar em conta as dificuldades destes alunos,
de forma a não excluí-los de nenhuma atividade. É o caso dos alunos “com laudos
de déficit de atenção, de hiperatividade, asperge, autismo, dislexia, os materiais
usados precisam atingir a todos os alunos, sem permitir a exclusão dos mesmos”
(L2).
A Química indicada pelos alunos como algo difícil e abstrato, demanda mais
atenção por parte do professor quanto à seleção do material didático. Visto que
existe a resistência dos estudantes para com a disciplina, a escolha do material
pode desmotivar ainda mais este aluno ao aprendizado. Um exemplo entre tais
recursos compreende a utilização do poema, pois na opinião do entrevistado L2,
a possibilidade de achar uma turma que goste de poesia tende a zero, ainda mais
um aluno que aprecie conjuntamente a Poesia e a Química. E usar tal recurso não
possibilitará a motivação dos estudantes para aprendizagem” (L2). E para Karling
(1991) a motivação deve ser o primeiro passo para o aprendizado dos alunos.
Outra condição para seleção dos materiais didáticos consiste na integração
dos objetivos de ensino com os conteúdos a serem ensinados. Onde os próprios
autores dos manuais de didática, Nérici (1971), Karling (1991), Zabala (1998),
afirmam ser necessário pensar nos conteúdos para seleção dos materiais didáticos.
Uma vez que as escolhas dos materiais didáticos faz parte de uma sistematização
para organizar o planejamento. Mas não impede o processo inverso, uma vez que
os entrevistados ao conhecer uma diversidade maior de materiais, estão
preparados para pensar primeiro no material didático e assim reconhecer suas
potencialidades para trabalhar com determinados conteúdos.
Em alguns casos os professores se esquecem de que o material deve estar
associado ao objetivo de ensino, ou até mesmo acreditam que para fazer o uso do
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
material não precisam ter domínio do conteúdo. Para L2 a pior besteira é achar
que não precisa do domínio do conteúdo para usar o material didático” (L2). Pois,
não podemos esquecer que depois dos objetivos propostos são os conteúdos a
serem ensinados em sala de aula que norteiam a escolha e utilização dos materiais
didáticos” (FISCARELLI, 2008, p.79).
Vale ressaltar que conhecer os conteúdos específicos da área de
conhecimento, como é o caso da Química não se restringe a definição de conceitos
científicos, mas conhecer os problemas que originam a construção do
conhecimento, as interações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade, rompendo
com a visão de uma Ciência verdadeira distante das influências sociais (CARVALHO;
GIL-PÉREZ, 2011).
A seleção também implica em sua disponibilidade e acessibilidade (BORGES,
2000). Segundo Fiscarelli (2008), no momento do planejamento, o professor deve-
se ater ao uso dos materiais didáticos disponíveis na escola e os que apresentam
possibilidade de uso em sala de aula. Desta forma, o entrevistado L2 afirma ser
indispensável [...] uma pesquisa intensa de qual material encontra-se acessível na
biblioteca, nos laboratórios, em todos os espaços da escola [...] e fazer um
levantamento do material disponível para o preparo da aula” (L2).
Em muito dos casos, a seleção de materiais que pertencem ao ambiente
escolar promove a valorização dos mesmos, como é o caso dos livros de literatura
dispostos nas bibliotecas escolares. Mas para o Ensino de Ciências/Química a
perspectiva de diversificar, ainda é muito comprometida pela falta de
disponibilidade de alguns materiais, como livro de literatura com divulgação
científica. No Brasil são poucos os exemplares com estas características acessíveis
nas bibliotecas de Educação Básica, e a falta de recursos financeiros dos estudantes
para dispor destes materiais faz que o mesmo esteja fora do alcance para a
elaboração de práticas educativas.
Há alguns materiais mais acessíveis como as histórias em quadrinhos, devido
ser um material de baixo custo, encontrados em diferentes comércios, bibliotecas,
bancas e jornais, shoppings, locadoras, entre outros (L3). Tal material faz parte do
cotidiano e do contexto escolar, e muitos estudantes compartilham seus
exemplares. Este material ainda pode ser adquirido em sebos por um baixo custo
ou ser encontradas em forma de tirinhas nos jornais e periódicos. Além disso, os
estudantes dispõem do hábito de leitura por este gênero textual, visto que o gibi
e/ou histórias em quadrinhos estão inseridos no contexto escolar desde as séries
iniciais.
SABER PREPARAR E DIRIGIR AS ATIVIDADES
Os entrevistados apontaram pontos satisfatórios no processo formativo no
que concerne a saber preparar e dirigir as atividades, contribuindo para uma
postura prática frente ao conhecimento de referenciais teóricos e a participação
de propostas didáticas inovadoras como diferentes materiais didáticos. Alguns dos
indicadores podem ser observados no Quadro 3, onde apresentamos as unidades
de significado.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
Quadro 3 - Indicadores sobre o saber preparar e dirigir atividades
Categorias
finais
Categorias
iniciais
Unidades de significado
Saber preparar
e dirigir as
atividades
Saber
elaborar
atividades
[...] é neste momento que consegue montar um
plano de aula, organizar as atividades e verificar
como este material pode auxiliar em suas
práticas escolares (L2).
[...] dividiram em grupos [...] distribuímos
algumas (histórias em quadrinhos) HQs, como
por exemplo, Turma da Mônica, Tio Patinhas, Zé
Carioca [...]. Após a explicação para execução das
atividades, iniciaram a pesquisa sobre os
conceitos relacionados ao conteúdo de soluções
(L1).
Saber
articular os
materiais
didáticos em
uma mesma
atividade
[...] selecionar um trecho de um filme e trazer
um texto de um jornal para trabalhar sobre CTSA
ou utilizar os poemas e a música para tratar as
questões de gênero, da discriminação racial,
além dos conceitos científicos (L3).
[...] levar um livro de literatura com divulgação
científica [...] e a partir da interpretação sobre
aquela temática elabore uma história em
quadrinho relatando as compreensões retiras
dos livros (L1).
[...] durante a Semana da Consciência Negra
trabalharam com o poema “Lágrima de Preta”, a
música, o vídeo da série “Women in Chemistry”
seguida de uma receita culinária para discussão
de um experimento sobre superfície de contato
na velocidade da reação (L2)
Fonte: Autoria própria (2017).
A segunda categoria consistiu em propiciar aos professores a oportunidade de
preparar e dirigir as atividades, em virtude do treino e manuseio dos materiais
didáticos. O processo viabilizou a aquisição de habilidades e conhecimentos sobre
determinados objetos a serem inseridos no Ensino de Química. Apesar do uso da
palavra treino, o seu significado não deve ser visto como algo mecânico, mas como
um momento oportuno para reconhecer as características e especificidades dos
materiais. Ao tratar-se de um período de instrumentalização pelo manuseio por
parte dos futuros professores com materiais alternativos, contribuindo para a
mobilização de um saber que compete preparar atividades utilizando tais
materiais, pois segundo o entrevistado L2 “[...] é neste momento que consegue
elaborar um plano de aula, organizar as atividades e verificar como este material
pode auxiliar em suas práticas escolares”.
Caso isto não ocorra, os materiais podem ser considerados apenas como
adereços, sendo incapazes de mudar a prática, na medida em que não conseguem
transformar os processos que levam ao ensino e aprendizagem. Sendo,
fundamental a organização e sistematização de ideias imposta por um
planejamento para incorporar os materiais didáticos que corroborem com as
questões cognitivas, emotivas ou psicomotoras do estudante (CARVALHO; GIL-
PÉREZ, 2011).
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
Como exemplo está a descrição da atividade realizada pelo entrevistado L1,
onde o mesmo relata a experiência desenvolvida em uma escola parceira ao
subprojeto utilizando as histórias em quadrinhos como recuso didático para
trabalhar os conceitos científicos de Química referentes a Soluções. O primeiro
momento baseou-se na apresentação da proposta didática aos estudantes. Em
seguida se dividiram em grupos de acordo com suas afinidades. Também
distribuímos algumas HQs, como por exemplo, Turma da Mônica, Tio Patinhas, Zé
Carioca, com intuito de apresentar as estruturas (linguagens) dos quadrinhos. Após
a explicação para execução das atividades, iniciaram a pesquisa sobre os conceitos
relacionados ao conteúdo de soluções. A segunda aula ocorreu dentro de sala de
aula, onde os restantes dos alunos iniciaram a fase de elaboração do roteiro para
a criação das Histórias em quadrinhos (HQs) referentes às compressões dos
conteúdos abordados. Para isso foram indicados alguns referenciais, bem como
disposição de livros didáticos para a consulta em sala de aula” (L1).
A descrição da atividade pelo entrevistado corrobora com as ideias de
Carvalho e Gil-Pérez (2011) ao mostra que saber dirigir as atividades, envolve
desde a apresentação adequada das atividades para compreensão global da
atividade, até mesmo a divisão de pequenos grupos para acompanhamento e
observação do processo de desenvolvimento da proposta didática. Ainda na visão
dos autores, tal saber propicia a escolha de um ambiente agradável, organizado e
tranquilo, capaz de favorecer interação em entre aluno e professor para
desenvolvimento do trabalho. Além disso, a indicação de outros referencias
teóricos possibilita momentos para inserir a pesquisa no ensino e transmitir os
interesses dos sujeitos na atividade (CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011).
A elaboração e planejamento de atividades teórico-práticas contribuíram para
os bolsistas perceberem a possibilidade de articular os materiais didáticos, ou seja,
unir os recursos em uma mesma atividade de acordo com os objetivos de ensino.
Na fala dos entrevistados, várias formas de articulação, como “[...] selecionar
um trecho de um filme e trazer um texto de um jornal para trabalhar sobre CTSA
(...), ou utilizar os poemas e a música para tratar as questões de gênero, da
discriminação racial (L3).
A articulação proporciona dentre outras questões, o trabalho dentro de uma
perspectiva CTSA, ao levar para as salas de aulas discussões de temáticas sociais
relevantes para Ensino de Ciências. Neste caso, o professor precisa ter o domínio
da matéria a ser ensinada, não se restringindo a simples definição dos conceitos
científicos, mas inter-relações dos conhecimentos científicos com o cotidiano do
aluno, as implicações de questões ambientais e sociais, o desenvolvimento de
novas tecnologias frente os interesses embutidos, o reconhecimento da Ciência
como uma construção humana, dentre outros (CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011).
Outra forma de articulação é citada pelos entrevistados como: levar um livro
de literatura com divulgação científica e pedir aos alunos de cada grupo uma
leitura da obra, e a partir da interpretação sobre aquela temática pode-se elaborar
uma história em quadrinho relatando as compreensões retiradas do livro” (L1). Ou
até mesmo elaborar uma oficina articulando a poesia, o vídeo, o experimento, a
culinária, a música, etc., sobre uma determinada temática (L1). Um exemplo desta
proposta pode ser vista na fala de L2 ao relatar que: durante a Semana da
Consciência Negra trabalharam com o poema “Lágrima de Preta”, a música Canto
das Três Raças de Clara Nunes”, o vídeo da série “Women in Chemistry” seguida
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
de um experimento baseado em uma receita culinária para discussão de conceitos
científico sobre superfície de contato referente aos conteúdos de Cinética
Química[...] E as atividades contribuíram para enriquecimento da oficina e chegar
aos objetivos propostos (L2).
Ademais a junção dos materiais, Segundo Fiscarelli (2008), possibilita o
envolvimento de um número maior de indivíduos numa mesma sala, respeitando
a individualidade e a particularidade na construção de conhecimento. Levando em
contra as teorias de Educação como base para fundamentação do planejamento
das atividades em sala. São estas teorias de aprendizagem que auxiliaram os
professores na organização e sistematização de suas ações, bem como a seleção
dos materiais didáticos para as práticas escolares (CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2011).
Uma vez imersos nas teorias de Educação e familiarizados com os diferentes
materiais didáticos, será possível “dominar alternativas metodológicas que
possibilitem diversificar as formas de ensinar” (BORGES, 2000, p. 63).
A união dos materiais didáticos ainda permite aumentar e extrapolar as
potencialidades didáticas do próprio objeto, como é o caso da interdisciplinaridade
e as relações entre Arte e Ciência. Os poemas mostraram grande potencial para
estas relações, como por exemplo, o Poema do Coração de Antonio Gedeão, sendo
citado por L3, como “um gênero textual que possibilita atrelar os conteúdos
científicos do corpo humano de domínio da área da biologia com as questões
relacionadas às emoções e sentimentos presentes nas belas frases do poema”.
Outro exemplo é o poema Lágrima de Preta de Antonio Gedeão, uma vez que o
[...] recurso permitiu entender as relações entre os conteúdos da Química, ao
falar do método científico pelo apontamento de situações que envolvem os termos
das funções inorgânicas, as vidrarias de laboratório, mas descrito em forma de
poema (L3).
Nesta categoria verificou-se que a partir do momento que os futuros
professores são inseridos em um contexto que propicia o contado com diferentes
materiais didáticos, a familiaridade com estes instrumentos possibilitar aprender
sobre as características e potencialidades dos materiais no ensino. São estes
conhecimentos os responsáveis para elaboração e organização de propostas
didáticas inovadoras pela utilização de outros materiais para além do livro didático.
Na concepção dos bolsistas entrevistados o processo formativo contribuiu para
uma saber fazer, onde o professor tem condições de manipular objetos antes
desconhecidos, treinar situações didáticas inovadoras, e com isso saber preparar
e dirigir atividades fundamentadas por suas experiências.
Diante do exposto até o momento, é possível verificar as contribuições em
torno da formação de um professor mais criterioso para seleção e utilização dos
materiais didáticos. Sendo que, o processo formativo possibilitou o
reconhecimento de critérios, cuidados e recomendações para inserir os materiais
em sua prática docente. Para isso, é necessário realizar a análise do material, para
averiguar suas potencialidades e limitações, constatar a veracidade das
informações apresentadas, verificar os termos e princípios descritos, identificar a
disponibilidade, bem como o nível cognitivo do aluno. Sem esquecer a importância
da integração dos conteúdos e objetivos de ensino para seleção dos materiais
didáticos.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O propósito da pesquisa de identificar quais contribuições são percebidas
pelos licenciandos em um processo formativo que utiliza diferentes materiais
didáticos alternativos no contexto do PIBID evidenciou, entre outras constatações,
a mobilização de saberes necessários para inserir os materiais didáticos em sua
prática docente.
A pesquisa apresentou resultados relevantes sobre os saberes mobilizados
descritos acima para utilização dos materiais didáticos no Ensino de Química. Tais
resultados buscam romper com uma visão simplista dos critérios e das
recomendações a serem seguidos para inserção de materiais alternativos em
atividades escolares. Essas sugestões são importantes uma vez que em algumas
situações os materiais didáticos servem apenas como diversão e passatempo, não
levando em consideração os objetivos de ensino e aprendizagem.
Os resultados mostram convergência entre os saberes apontados pela
literatura e aqueles constituídos a partir das concepções dos entrevistados,
enfatiza a necessidade dos professores serem mais críticos no momento de
planejar uma atividade didática e desejar acrescentar um material novo e
desconhecido. A tentativa de inovar por meio de diferentes materiais, caso não
seja bem planejada, pode resultar num fracasso até mesmo para compreensão do
conteúdo de química pelos alunos. Pois quando não instruídos, os docentes estão
aptos a cometer erros seja pela forma como utiliza o material ou pelo
planejamento errôneo sem integrar os conteúdos e aos objetivos educacionais.
Com isso, a participação dos envolvidos no processo de formação possibilitou
aos futuros professores o conhecimento de diversos recursos com potencialidades
didáticas para Ensino de Química dentro de uma proposta inovadora. Fato
relevante frente ao quadro identificado na pesquisa, no qual evidencia que a
maioria dos entrevistados que lecionam na Educação Básica nunca teve acesso a
estes recursos, e somente neste momento houve o contato com tais materiais
didáticos fundamentados por referenciais teóricos.
A pesquisa mostrou a importância de haver diferentes espaços para a
formação de futuros professores com o intuito de não perpetuar as metodologias
tradicionais pautadas na transmissão de conceitos e passividade dos alunos em
relação ao conhecimento. O espaço para estudo de materiais didáticos para Ensino
de Química configura-se como uma oportunidade para reconhecer outros
materiais para além do livro didático como instrumento de ensino. Portanto,
possibilita que suas ações futuras como professores não se reduzam a um mero
círculo de críticas sobre o ensino tradicional, mas lhes condições de atuar de
forma diferente em sala de aula.
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
The mobilization of knowledge from the use
of different didactic materials in the context
of PIBID
ABSTRACT
The present article is part of a dissertation which objective was to investigate what possible
contributions are perceived by the future Chemistry Professors about a study directed with
different didactic materials within the scope of the Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação a Docência (PIBID). The research was carried out in 2014, where the activities
carried out by the scholarship holders in the internal meetings and activities in the schools
partnered with the project were monitored, using a variety of materials with didactic
potential for Teaching Chemistry. The research was characterized as qualitative and its data
collection involved the transcription of the audios of the interviews with eight subjects of
the group. The informations were analyzed based on the Content Analysis Methodology,
making it possible to identify contributions in the formative process of the future teachers,
based on the use of different didactic materials. The results pointed to the mobilization of
knowledge, which includes knowing how to prepare and direct activities insofar as the
knowledge of the diversity of resources and theoretical basis corroborates the insertion of
materials into teaching practices. Another knowledge evidenced in the research is the know
how to select the teaching materials, where the teacher needs to be aware of the criteria
and recommendations to insert the materials into a planning consistent with the teaching
objectives.
KEY WORDS: Didactic material. Teacher training. Chemistry teaching
ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018.
AGRADECIMENTOS
A CAPES pela bolsa concedida, e a colaboração dos participantes envolvidos na
pesquisa. E ao Grupo de Pesquisa em Ensino e Aprendizagem de Ciências e
Matemática pelas calorosas discussões sobre esta pesquisa.
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Recebido: 30 jul. 2017
Aprovado: 20 jan. 2018
DOI: 10.3895/actio.v3n1.6864
Como citar:
COSTA, F. R. S; CAMARGO, S.; SILVA, C. S. A mobilização de saberes a partir do uso de diferentes
materiais didáticos no contexto do PIBID. ACTIO, Curitiba, v. 3, n. 1, p. 91-114, jan./abr. 2018. Disponível
em: <https://periodicos.utfpr.edu.br/actio>. Acesso em: XXX
Correspondência:
Franciellen Rodrigues da Silva Costa
Avenida Colombo, n. 5790, Jardim Universitário, bloco F67, sala 007, Maringá, Paraná, Brasil.
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